Determinismo econômico, o ciclo da borracha e a ZFM – por Professor José Melo

Ex-governador José Melo/foto: Divulgação

Meus amigos e minhas amigas, divido com vocês algumas reflexões sobre os Ciclos de Desenvolvimento do Amazonas: o da Borracha, o da Zona Franca de Manaus e a Regulamentação da Reforma Tributária.


Por definição, determinismo econômico é “a ideia de que uma base econômica determina todas as outras esferas da vida social”.

Ao longo de sua existência, o estado do Amazonas teve dois grandes Ciclos de Desenvolvimento: o da Borracha e o da Zona Franca de Manaus. O ciclo da borracha foi uma atividade econômica importante para o Brasil, fruto da Revolução Industrial, que demandou essa matéria-prima a partir da segunda metade do século XIX.

Na floresta amazônica, no norte do Brasil, havia uma árvore chamada seringueira, da qual era extraído um látex que, uma vez defumado, produzia a matéria-prima da borracha.
Com o advento da Segunda Guerra Mundial, os países aliados não apenas mantiveram, como também financiaram a produção em grande escala da borracha, largamente demandada pela indústria bélica.

A mão de obra utilizada era composta principalmente por nordestinos (expulsos
de suas terras pelas grandes secas). Sírios, libaneses e portugueses também participaram
intensamente do ciclo da borracha.

Os navios, como os gaiolas e as chatinhas, subiam os rios amazônicos, sobretudo os rios Purus, Juruá e Madeira, transportando mercadorias e recolhendo os produtos (borracha, balata, sernambi, castanha, couros e peles). Parte das transações era feita sob a forma de escambo.

O 1º ciclo da borracha ocorreu no final do século XIX e início do século XX (1879 a 1912). O 2º ciclo da borracha aconteceu entre 1942 e 1945, durante a Segunda Guerra Mundial.
Juntamente com o café, a borracha compunha os principais itens da pauta de exportação do Brasil. Cidades como Manaus e Belém foram fortemente influenciadas durante o ciclo da
borracha.

O ciclo da borracha foi uma época de ouro para o nosso estado: a cidade de Manaus cresceu e se desenvolveu, com aparatos sociais sendo implantados e a economia florescendo. Da Europa, vinha tudo para cá; prédios nunca antes vistos foram construídos com material europeu (Teatro Amazonas, Prédio da Alfândega, Palácio da Justiça); a cultura floresceu; surgiram escolas e hospitais. Era a mão de Deus abençoando o Amazonas; tudo florescia.

Mas um inglês chamado Henry Wickham levou sorrateiramente mais de 70 mil sementes para o Royal Botanic Gardens, em Londres. Elas foram geneticamente selecionadas e enviadas para serem plantadas na Malásia, de forma ordenada, possibilitando uma redução brutal de custos na produção em relação à borracha extraída na Amazônia.

Em pouco tempo, o 1º ciclo da borracha foi à bancarrota. Ainda tivemos uma sobrevida com a Segunda Guerra Mundial, que aumentou a demanda por borracha, mas essa fase durou muito pouco.

O fim da Segunda Guerra Mundial também decretou a falência do 2º ciclo da borracha na
Amazônia, transformando-a em um “Porto de Lenha”.

Anos depois, veio a Zona Franca de Manaus, que gera mais de 121 mil empregos diretos e quatro vezes mais empregos indiretos. Até outubro deste ano, ela já havia faturado US$ 32 bilhões; é responsável pelas escolas, hospitais e pelo desenvolvimento econômico e social do estado, transformando Manaus no sexto maior PIB brasileiro. Como no ciclo da borracha, vivemos um período de progresso e desenvolvimento.

Não temos hoje um inglês para surrupiar a Zona Franca de Manaus; pior, temos o resto do Brasil todo querendo acabar com ela.

A regulamentação da Reforma Tributária no Congresso Nacional é uma espada afiada sobre
nossas cabeças. Ontem, o Senado da República, por uma ação coordenada e direta dos senadores amazonenses — o relator Eduardo Braga, o líder do PSD Omar Aziz e Plío Valério -, manteve as vantagens comparativas do Polo Industrial (embora a cobrança de impostos no destino, como está na Reforma, cause perda de receita ao estado do Amazonas, e empresas como a Honda, que têm alto índice de verticalização, também sofram perdas nos seus incentivos), modificando o que veio da Câmara Federal, que feria de morte as empresas do Polo Industrial de Manaus.

O projeto, agora modificado pelo Senado, volta à Câmara, onde será votado na próxima semana. A configuração da Câmara Federal dificulta a defesa plena dos benefícios da Zona Franca de Manaus (ZFM). Com 513 deputados, a representação é desigual entre os estados: São Paulo tem 70 deputados, Minas Gerais 53, Rio de Janeiro 46, enquanto o Amazonas conta com apenas 8 representantes. Isso coloca o estado em desvantagem para proteger os interesses da ZFM, especialmente porque muitos estados mais populosos, como os citados anteriormente, bem como Bahia, Rio Grande do Sul e Paraná, historicamente se posicionaram contra o modelo.

A influência política de estados com grandes bancadas, somada à presença de figuras
importantes, como o senador Sérgio Moro, do Paraná, aumenta as dificuldades para manter os benefícios da ZFM. Mesmo que o Senado tenha preservado esses incentivos, na Câmara será necessário um trabalho intenso de articulação política para conquistar o apoio de outros estados e demonstrar a importância do modelo para o desenvolvimento econômico do país e da preservação da floresta amazônica, que é patrimônio de todos os brasileiros.

Não é justo com o Amazonas, que tem trilhões de dólares em recursos naturais estratégicos preservados — patrimônio de toda a nação brasileira — e que só estão assim porque a Zona Franca de Manaus existe, voltar à escuridão, como aconteceu no final do Ciclo da Borracha, tornando-se novamente um “Porto de Lenha”.

Professor José Melo é ex-Governador do Estado do Amazonas e analista político

FONTEex-Governador do Estado do Amazonas e analista político
Artigo anteriorFord inicia a venda do Mustang Mach-E GT Performance 2024
Próximo artigoAmazonas está sob alerta de chuvas intensas nesta terça-feira

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui