A morte – por Flávio Lauria

Flávio Lauria é Administrador de Empresas e Professor Universitário

Caros amigos e leitores, quero no presente artigo apenas tentar poetizar a dor da saudade, As vezes dizemos estou com “saudades”, principalmente agora nessa pandemia quando muitos se foram, mas para mim, claro que quando morre alguém a saudade dói, sinto muito mais saudades das pessoas que não vejo a algum tempo, e que representam muito.


A morte nada mais é do que uma passagem. A passagem de um mundo que conhecemos bem, para outro totalmente desconhecido. E, por isso, amedronta e traz dor…Por isso, os monges beneditinos jamais falam de morte e sim de passagem. Passamos por esta vida, como um grande presente de amor que deus nos deu… Nosso nascimento, certamente trouxe muitas felicidades e amor aos nossos pais e, vendo assim, como uma passagem, podemos imaginar que o que nos espera, na outra etapa, na outra passagem… É algo muito melhor.

Nada mais natural que a morte! E, tenho certeza que um dia todos nos encontraremos: a vida é um mistério maravilhoso! Escrevo o presente com a dor da saudade pela partida vitimas dessa pandemia de muitos amigos e amigas, exatamente a meia noite e dez minutos, no maior silêncio, mas o silêncio é uma granada escutada na fuga da alma. Eu sento diante do birô noturno da vida para escrever o instante. As palavras fogem. E apenas há ressonâncias sinalizando a eventualidade das sílabas nos lábios. Sinto ser apenas de carne e sonho, sangue e esperanças vagas possibilidades de ecos nas odisseias cavalgadas. Catalogo lembranças que cedo me queda o riso do inicio da madrugada.

Entro nas labaredas do alvorecer, catando linguagem. Silencio. Vejo a ciranda das horas passar. Dedos pesados de chumbo. Sacrifício inconcluso no calendário. Como se a lâmina resoluta cortasse rajada, seus dias e vocabulário. Tinem rajadas e folhas longilíneas no traçado da missão anunciada. A paisagem é este estandarte florido, berço acústico no imaginário da tarde dos encontros e das palavras. Pulsam partituras de festim nas cordas serenas do indivisível do coração que se despoja no cavalete das pinturas envelhecidas. A palavra é o espelho, e a poesia é um vidro quebrado. Há de ser distorcida a palavra para tirar dela a essência e a cor crucial de sua plasticidade. Trabalhar com elas é um risco permanente de se tonar luz, ou cadafalso, o caminho do mundo. ser um verdadeiro lavrador da metáfora e do sentimento.

Os versos podem ser pesados ou leves conforme os aviões. E tem-se que confiar em seu rumo quando se embarca numa dessas aeronaves sem nunca se ter visto o piloto. De repente, pode um voo libertar ou aprisionar. Um voo do gavião certeiro, que não sai do chão sem a presa em plena mira. Ou um ultraleve, que sobrevoa os açudes e, de repente, encontra o oceano. Das cores a correr no meio-fio do amanhecer da ilusão humana. Tento as vezes ser poeta, o poeta é filho da linguagem. Poemas são lavras que consomem por dentro o coração.

Flávio Lauria é Administrador de Empresas e Professor Universitário

A leitura dos versos deve ser o olhar penetrante da medusa, que transforma curiosidades em granitos. O sonho, é um poema incontrolável. Talvez por isso mesmo os poetas sejam considerados lunáticos. A lua, certamente, sempre foi o astro principal da constelação da lírica. Plangente. Esta a palavra que exprime a situação, inesperadamente vivida, nestes últimos dias iem Manaus.

Abro o computador e todo dia fico dividido entre o martírio e o taciturno. Notícia súbita de que um amigo ou amiga, partira sem a mínima chance de um olhar ou um aceno a lhe transmitir o adeus. Não estava mais entre os vivos. Havia atendido ou não um chamado lá do alto. Doloroso saber que não havia sequer quatro pessoas para lhe segurar a alça do caixão. Pela pandemia não pode ter mais de duas ou três pessoas para acompanhar o velório. Recordo as passagens que tive com muitos deles A ânsia de perscrutar o absoluto me invade. Acho o cemitério sinistro como é redundante dizê-lo.

A morte, então, para mim, não chegará para me levar vestida de outra cor senão a rubra. Um tipo crepuscular, igual a uma paisagem que chega pincelada de vermelho. O corpo nunca adoece antes da alma. Passamos a vida adiando o agora. Quantos acenos inconclusos, quando beijos adiados, quantos abraços esquecidos, quanta ternura poupada por conta da máxima cruel de nossa época: “não tive tempo”? É o jantar recusado à amada, a presença-ausente do Dia das Mães, o esquecimento sintomático do aniversário de um amigo. São questionamentos que me acompanham ao transitar, contrito, e somente pelas ideias, já que não vou a cemitério, por entre a selva de mortos nesse mar de catacumbas ou uma cidade de prédios guardando a insônia inquieta dos solitários. Não adianta adiar o mapa do coração, dizer que amanhã é possível, ou talvez quem sabe.

Estamos assim desprezando a arte de viver e o encanto que as belezas, inapercebidas por deformação profissional, trazem. Se não o fazemos para que adiantou respirar ou transitar nesse mundo sublunar? De fato, quem tem a certeza de amar e ser amado não precisa de uma justificativa material para traduzir seu sentimento. Um gesto basta. No planeta Terra não cabe solidão. A essência do abraço não está no outro. Está em nós. Abrace o outro para ser feliz. Voltando ao eixo do quotidiano, tenho a impressão de enxergar as coisas por outro prisma. Um diamante, por mais belo que seja, precisa ser lapidado para se tornar uma joia. Observemos o sândalo que perfuma o machado que o fere. Nosso ofício de escrever deve nos levar a uma reflexão profunda da alma humana, de suas dignidades e limitações.

As ações mais singelas são as que frequentemente preenchem nossos dias. Orná-las de um significado maior, valorizando detalhes, lembrando gestos, nos previnem de uma despedida invisível. Somos responsáveis pelo nosso viver e morrer. Não podemos colher camélias se plantamos rosas. Temos de enfrentar as dificuldades do dia-a-dia sem a parcimônia do afeto, sem a sobreposição material de nossos carinhos. E deixemos que os mortos enterrem seus mortos, Jesus! Os acontecimentos, próprios da existência, interpretamos mais como tragédias do que como dádivas, e assim passa despercebida a riqueza da vida, do sonho e do tempo, tal como Shakespeare filosofou ao dizer: “Sofremos muito com o pouco que nos falta e gozamos pouco com o muito que temos”.

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