Banalização da corrupção(Por Paulo Figueiredo)

Advogado Paulo Figueiredo(AM)

Não há um único dia sem que a grande imprensa não trate da corrupção no Brasil. Ao espelhar a realidade, como de sua obrigação, a mídia rotiniza os fatos criminosos que envolvem a Nação. Confesso que não tenho mais a menor disposição para ler as muitas páginas dos jornais que cuidam do tema. Os textos são repetitivos e basta passar os olhos pelos títulos e nomes dos personagens para que se tenha uma visão do escândalo. Ainda assim, considero importante a ampla cobertura oferecida aos acontecimentos delituosos, como contribuição dos meios de comunicação no combate ao crime contra o erário, que se alastrou como metástase pelo corpo do Estado brasileiro.
Há um ritual que é seguido à risca pela mídia. Primeiro, acompanha-se a operação da Polícia Federal. Em seguida, tem-se a entrevista coletiva com os dirigentes das investigações, que detalham os atos persecutórios. Mais adiante, ouve-se os implicados e seus advogados, com a cantilena de sempre.


Na melhor linha do lulopetismo e de seu líder maior – o ex-metalúrgico Lula da Silva, os envolvidos proclamam-se inocentes, não sabem de nada, não viram nada e nunca fizeram nada. Coitadinhos. De igual modo, caem de pau em cima das colaborações premiadas e condenam o que chamam de vazamento seletivo das informações sobre seus crimes. Seguem o exemplo da presidente afastada, Dilma Rousseff, que vociferou insultos aos delatores e contra a divulgação dos atos investigatórios, esquecendo-se que foi ela quem sancionou a lei das delações.

No início, há um jogo de faz de contas, quando todos preferem bancar a avestruz, até serem apanhados em contradições ou diante de provas irrefutáveis. Vencida a etapa inaugural, quem possui tal condição, busca o prêmio do foro privilegiado ou por prerrogativa de função, uma vez que no Supremo Tribunal Federal os julgamentos arrastam-se por anos e anos a fio, uma vergonha para a maior corte de justiça do país. Veja-se o que acontece com a Lava-Jato e outras operações. Enquanto o juiz Sérgio Moro já condenou perto de uma centena de delinquentes, na outra ponta, nenhum político foi julgado pelo STF e muito menos condenado. O caso de Renan Calheiros é emblemático. Há cerca de 10 anos responde a processo no Supremo, que não chegou sequer a ser pautado para julgamento, somando-se agora a mais de uma dezena de outros, embrulhado em pesados delitos do Petrolão e afins, sob a expectativa de tornar-se mais uma vez inatingível ou impune.

Com a maior desfaçatez, Calheiros coloca projeto de lei em votação pelo Senado, que limita a ação da magistratura e o poder investigatório do Ministério Público, a pretexto de coibir a prática de abuso de autoridade, mas com o claro propósito de frear a Lava-Jato. De mais a mais, indicou Romero Jucá para presidir a comissão que examinará a matéria, outro envolvido nas investigações de Curitiba, recentemente defenestrado do ministério do governo Temer.

Por isso mesmo, que me perdoem os leitores, mas não posso deixar de identificar certa injustiça nas prisões de Marcelo Odebrecht e de outros menos votados. Não sou advogado do presidente da Odebrecht e é claro que sua condenação é devida, pois os crimes de corrupção de largo alcance que praticou merecem ser punidos. Todos eles, como genocidas, matam por atacado, porque a corrupção retira grande volume de recursos que bem poderiam ser aplicados na construção de hospitais públicos, prontos-socorros e na ampliação do sistema de saúde. Não são poucos os que morrem no Brasil a cada dia pela falta de meios materiais de assistência médica e hospitalar. No entanto, não deixa de soar como incompreensível que suporte sozinho o ônus da sentença penal e que outros continuem livres, em condições semelhantes ou superiores às suas, no gigantesco quadro da corrupção nacional.

A partir da Lava-Jato, entusiasma constatar que hoje a persecução judicial e criminal não se restringe mais às favelas ou a áreas miseráveis e periféricas, ao alcançar o andar de cima da sociedade. Chegou-se, finalmente, aos endereços mais nobres e caros do Rio de Janeiro e São Paulo, sepultando-se a regra corrente da inimputabilidade, como regalia conferida aos poderosos no Brasil. Fica a lição e suas consequências. Mas, como observou o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, em seminário promovido pelo Conselho Nacional do Ministério Público, com a “sociedade devastada pela impunidade”, é preciso acabar com o foro privilegiado, “que é antirrepublicano, faz mal ao Supremo e gera impunidade”, frente ao enorme volume de ações sem decisão em seu tribunal.

Não haverá Justiça sem que todos os autores do crime sejam punidos, na extensão de suas responsabilidades. Por que nesse cipoal de infrações penais apenas Dirceu e Vaccari amargam a prisão, enquanto seus companheiros de conta e de poder continuam escarnecendo do povo brasileiro e da justiça do país? A Nação aguarda uma resposta do Supremo Tribunal Federal, com a urgência das urgências, ciente de que não há nada de mais injusto do que a justiça quando tarda.(Paulo Figueiredo – Advogado, Escritor e Comentarista Político – [email protected])

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