
Criado para promover a conscientização sobre a preservação dos recursos naturais, o Mês do Meio Ambiente reacende discussões urgentes sobre os desafios da gestão de resíduos no Brasil. Entre eles, um problema pouco visível e ainda longe de ser resolvido: o descarte irregular de resíduos da construção civil. Segundo levantamento da Associação Brasileira para a Reciclagem de Resíduos da Construção Civil e Demolição (Abrecon), o país ainda convive com mais de 2.500 lixões ativos, muitos deles alimentados por entulho lançado sem qualquer controle. Ao mesmo tempo, menos de 30% do volume gerado é reciclado de forma adequada.
A construção civil é um dos setores que mais geram resíduos sólidos no Brasil, e embora a cadeia da reciclagem de RCD tenha avançado nos últimos cinco anos, ainda enfrenta inúmeros entraves para se consolidar. O Relatório da Pesquisa Setorial 2024 da Abrecon aponta que o Brasil gera cerca de 106 milhões de toneladas de entulho por ano, mas menos de um terço disso passa por processos de reaproveitamento.
“A maioria dos municípios não possui planos específicos para os resíduos da construção, nem estruturas básicas como ecopontos ou fiscalização efetiva. Isso estimula o descarte clandestino e a proliferação de lixões urbanos, o que compromete a saúde pública e o meio ambiente”, afirma Rafael Teixeira, especialista em transporte e reciclagem de entulho e Vice-Presidente da Abrecon.
Além do impacto visual e da degradação ambiental, os lixões também representam risco direto à saúde. Resíduos dispostos a céu aberto podem atrair vetores de doenças, contaminar o solo e os recursos hídricos, além de elevar a emissão de gases de efeito estufa. “É preciso entender que o entulho não é inerte. Ele carrega tintas, solventes, metais, plástico e outras impurezas que, quando descartados de forma incorreta, têm efeito devastador sobre áreas urbanas e naturais”, alerta Teixeira.
O levantamento mais recente da Abrecon mapeou mais de 2.500 lixões em funcionamento no país — um dado alarmante, sobretudo porque essas estruturas são ilegais e configuram crimes ambientais graves. Os lixões representam sérias ameaças ao solo, às águas subterrâneas, à biodiversidade e à saúde da população, já que recebem resíduos sem qualquer controle ou tratamento adequado. O descarte de entulho nesses locais, prática infelizmente ainda comum, poderia ser evitado com a implementação de políticas públicas eficazes, que regulam o transporte e a destinação dos resíduos da construção civil. Com regras claras e fiscalização, as construtoras teriam meios para realizar o descarte legal e sustentável, contribuindo para a erradicação dos lixões e para o avanço da agenda ambiental no setor.
Segundo a entidade, o uso de areia reciclada e agregados alternativos já é realidade em diversas obras públicas e privadas. No entanto, o acesso a esses insumos é limitado pela falta de regulamentação, incentivo fiscal e políticas públicas específicas. “Temos tecnologia, conhecimento técnico e soluções de baixo custo. O que falta é decisão política e vontade institucional de tratar o entulho com a seriedade que ele exige”, complementa Teixeira.
A ausência de regras claras sobre o transporte de entulho também é um problema recorrente. Hoje, não há uma autoridade nacional responsável por fiscalizar o setor ou exigir o rastreamento do RCD até sua destinação final. Na prática, isso significa que toneladas de resíduos circulam diariamente pelas cidades sem controle, alimentando o mercado informal e os lixões clandestinos.
Para Rafael, é urgente integrar a agenda da construção civil à pauta ambiental do país. O setor pode ser uma potência em sustentabilidade, mas precisa sair do papel. “O Brasil tem potencial para ser líder continental na reciclagem de resíduos da construção, mas isso só será possível com engajamento dos governos municipais e estaduais, fiscalização efetiva e conscientização da sociedade”, conclui Teixeira.