Câmara rejeita reduzir maioridade penal para crimes graves(Atualizada)

Manifestantes comemoram resultado/Foto: CD

Em uma decisão apertada, o plenário da Câmara dos Deputados rejeitou na  noite de ontem, terça-feira, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que reduz a maioridade penal para 16 anos, em caso de crimes graves. Para ser aprovado, o texto precisava de 308 votos favoráveis, mas recebeu 303.
Apesar de a maioria dos deputados ter votado a favor da medida, as propostas de mudança da constituição precisam do aval de pelo menos 3/5 dos 513 deputados. Outros 184 deputados votaram contra e três se abstiveram. A Câmara ainda precisa apreciar o texto original da PEC apresentada em 1993, que reduz a maioridade penal para todos os crimes. Segundo o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), essa votação pode ocorrer na semana que vem.


O relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF), aprovado em comissão especial, foi construído a partir de um acordo fechado entre o PMDB e o PSDB, que deixou o texto mais brando. A matéria previa a redução da idade para crimes hediondos (homicídio qualificado, latrocínio, estupro, por exemplo), crimes inafiançáveis, como tráfico, tortura e terrorismo, além de outros crimes graves: homicídio doloso, lesão corporal grave e roubo qualificado.O texto também estipulava que os jovens entre 16 e 18 anos teriam de cumprir pena separadamente de adultos e dos jovens internados.

A votação é uma derrota para a bancada da bala, que trabalhou pela aprovação da proposta. A PEC da redução da maioridade penal sofreu forte oposição do governo, que se aproximou dos tucanos Geraldo Alckmin e José Serra e passou a defender a alteração no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com o aumento da internação máxima de jovens infratores de três para oito anos.

Para se contrapor a proposta, o governo também antecipou um relatório que mostra um cenário catastrófico das penitenciárias brasileiras. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, apresentou a deputados índices de infecção por HIV nas cadeias, registros de homicídios e taxas de reincidência. Também levantou a tese de que a proposta daria permissão para jovens dirigirem e comprarem bebidas alcóolicas. A investida convenceu parte dos deputados.

Os defensores da redução da maioridade penal argumentam que os jovens de 16 anos já têm consciência de seus atos e cometem crimes com a certeza da impunidade. “Criança brinca, criança não mata, não”, discursou o líder da bancada da bala, Alberto Fraga (DEM-DF)

Além de considerarem a mudança inconstitucional, os críticos alegam que o sistema carcerário prejudicaria a ressocialização do jovem, além de agravar a superlotação das cadeias.

Nas contas do governo, a PEC 171 poderia levar 30 a 40 mil jovens para a cadeia por ano, só nos crimes de roubo qualificado e tráfico de drogas. “Esses compõem 80% dos crimes. São esses que vamos jogar no cárcere com os adultos? Nas medidas socioeducativas, 100% têm acesso à escola. Na penitenciária, todos têm acesso ao PCC e o crime organizado”, disse a líder do PCdoB, Jandira Feghali (RJ).

Panfletos e manifestações

Durante a votação, opositores à PEC 171/93 distribuíram panfletos com situações hipotéticas envolvendo jovens. “O adolescente que pegue escondido o carro dos pais, vá para a balada, beba e use drogas e, na volta para casa, a 190 km/h, atropele e mate um pedestre pode responder como adulto por homicídio doloso, com pena de seis a 20 anos de reclusão”, dizia um panfleto organizado pelo Grupo Parlamentar contra a Redução.

Com uma camiseta a favor da redução sob o paletó, Alberto Fraga (DEM-DF), criticou o cenário traçado no panfleto. “Usar isso como defesa, no mínimo o cara usou maconha estragada”, disse.

Em outro ponto, o texto trazia consequências sobre outras leis, como sobre uso de menores em filmes pornográficos e exploração sexual. “O jovem de 16 a 18 anos poderá acessar qualquer conteúdo adulto (…) poderá ver tudo no Netflix; (…) poderá jogar qualquer game”, alertava o panfleto.

A votação foi acompanhada por manifestantes favoráveis e contrários à redução da maioridade penal que receberam senhas distribuídas a deputados. Antes, estudantes que não conseguiram entrar no plenário se envolveram em confusões nos acessos à Câmara.

Maioridade e imputabilidade no mundo

Para entender a discussão sobre a diminuição da maioridade penal no Brasil é preciso entender a diferença entre maioridade penal ou criminal e imputabilidade penal (além de maioridade civil).

A maioridade penal define a idade a partir da qual um indivíduo responde por violar a lei penal na condição de adulto, sem diferenças ou garantias de leis voltadas a crianças e adolescentes. Assim, a maioridade penal estabelece o momento em que o indivíduo tem consciência de responsabilidades e consequências individuais e coletivas. Por exemplo, no Brasil, a Constituição define em seu artigo 228 que a maioridade penal acontece aos 18 anos. E é essa a idade que vem sendo discutida no Congresso: previamente aprovada a diminuição apenas nos casos de crimes hediondos, que cairia para 16 anos.

Entre 12 e 18 anos, os adolescentes cumprem penas estabelecidas pela legislação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – e não pelo Código Penal. Apenas as crianças menores de 12 anos no Brasil não podem ser responsabilizadas por nenhum tipo de crime – o que traça a idade mínima de imputabilidade penal (significa a possibilidade de atribuir a responsabilidade pela violação de lei penal, ou seja, pela prática de um crime, entendida como ação ou omissão típica, antijurídica e culpável).

É preciso entender que a maioridade penal não coincide, necessariamente, com a maioridade civil, nem com as idades mínimas necessárias para votar, para dirigir, para trabalhar, para casar e emancipação. Para ilustrar melhor: a maioridade civil no Brasil é de 18 anos (quando você se diz “maior de idade” e pode viajar para fora do Brasil e consumir bebidas alcóolicas sem concessão de pais ou responsáveis).

Veja como votou cada deputado presente a sessão:

Quadro de votação
Quadro de votação
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