Carta à Vitória – por Carlos Santiago

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado

Num universo infinito, num mundo de incertezas e numa vida de acasos, caminho refletindo, superando barreiras, rompendo correntes, negando o absoluto, expondo desafios sem rumos e as minhas fraquezas.


Nem sei da dimensão de tempo. Nem sei quanto tempo terei de vida. Nem sei da origem das leis da natureza. Nem sei do futuro da vida na terra.

Nunca saberei da quantidade de estrelas do universo. Nunca saberei de toda riqueza da imensidão dos mares. Nunca saberei de todos os impactos da fé humana.

Nunca saberei dos limites entre a emoção e a razão. Nunca saberei dos limites entre o individual e o coletivo. Nunca saberei dos limites entre o local e o universal. Nunca saberei definir fronteiras entre o amor e a paixão. Nunca saberei escolher entre o sol e a chuva.

Difícil julgar o canto dos pássaros. Difícil escolher a flor mais bela. Difícil separar a flora da fauna. Difícil escolher entre o pôr do Sol e as fases da Lua. Difícil escolher entre o azul do mar e o azul celeste.

Não consigo separar a luz da escuridão e da penumbra. Não consigo distinguir a importância entre as águas doces das águas salgadas. Não consigo realçar a vida humana de outras vidas do planeta.

Não sei diferenciar conhecimentos. Não sei fatiar filosofias, ciências e saberes. Não sei separar a alma do corpo. Não sei separar o ser da existência. Não sei entender contradições entre culturas humanas e a natureza.

Falta-me diferenciar a pobreza social da miséria, mas não consigo. Falta-me afirmar qual ideologia política é e foi mais perversa, mas tenho dúvidas. Falta-me apontar quais os piores governantes, mas tenho dúvidas. Falta-me justificar guerras pela paz, mas não consigo.

Não consigo estabelecer Deus. Não consigo falar de Deus. Não consigo entender qualquer Deus. Nem Deus de Espinosa. Não consigo associar o ódio e o amor com um ser divino. Não consigo entender o profano e o divino com crenças tolas.

A incerteza faz parte da vida humana e do universo. O inesperado atinge a todos. Ninguém escapa. Não é um mal nem bem. Há mais fenômenos fora das nossas forças e dos nossos domínios, mas servem para entendermos um pouco de nós, do outro e buscar respostas no universo.

A única coisa que podemos ter certeza é a incerteza. A única certeza da vida é a finitude que pode ser também uma causa que alimenta a incerteza, pois cada morte e cada nascimento indica outras possiblidades. A incerteza mostra, ainda, o quanto somos tolos.

Minha sobrinha Vitória Rafaela, a única certeza maior é do meu amor por ti. Certeza das nossas brincadeiras agradáveis e passeios alegres. Um dia, na sua fase adulta, depois da minha partida, pois sou finito, você sentirá com mais intensidade os tormentos do viver, saberá enfrentar as inquietudes da vida, saberá que só administramos aquilo que é possível de controle e não terá medo do inesperado.

Então, Vitória, viva sem amarras ideológicas, sem escravidão mental, sem achar que a vida é só certeza, não cultue crenças intolerantes, duvide sempre de respostas prontas, seja inquieta e ame o universo pelas suas incertezas e infinitudes. E, mesmo nos momentos difíceis, aproveita a vida para melhorar o mundo e conhecer você mesma.

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado.

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