Ciência brasileira sitiada – por Osíris Silva

Escritor e economista Osíris Silva/Foto: Divulgação

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) vive dramático momento – financeiramente exaurido – e desta forma não terá recursos para pagar bolsas e projetos a partir deste mês de outubro. A informação é do próprio Conselho. Caso seu orçamento não seja descontingenciado imediatamente pelo governo federal, cerca de 90 mil bolsistas e 20 mil pesquisadores poderão ser prejudicados pela interrupção dos pagamentos. O CNPq é a principal agência de fomento à pesquisa do País, exercendo um papel fundamental no desenvolvimento da ciência e da pós-graduação nacional, por meio do pagamento de bolsas e do financiamento de projetos.


Muitos pós-graduandos dependem desses recursos como única fonte de renda, para pagar as contas e se manter na universidade fazendo pesquisa. A despeito de sua importância estratégica para o desenvolvimento do país, o Conselho atingiu o teto orçamentário. O maior centro de financiamento da ciência no país tinha um orçamento previsto de 1,3 bilhão para 2017. Em abril, o governo federal determinou um congelamento de 44% de sua verba para o exercício em curso. O que impediu a injeção de 572 milhões de reais nesse estratégico setor.

De acordo com o site do CNPq, desde 2015 o orçamento da autarquia começou a minguar. Hoje, o CNPq precisa de 405 milhões de reais para fechar as contas até o fim do ano. Montante que, se não for liberado, trará prejuízos incalculáveis à ciência e às universidades. Observe-se que, no Brasil, para cada 1 milhão de pessoas, apenas 700 são cientistas. Enquanto a média na Europa beira a 7.000 cientistas na mesma quantidade. Dez vezes mais. Durante a crise de 2008, países como Coreia do Sul, Estados Unidos, China e a União Europeia passaram a investir mais em ciência e tecnologia, chegando a atingir 4% do PIB.

Escritor e economista Osíris Silva/Foto: Divulgação

O Brasil segue na direção oposta. Com efeito, obedecendo a política de redução de gastos públicos, aprovada pelo Congresso em 2016, o governo federal juntou o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações com o das Comunicações, uma mostra da menor prioridade da área. Em seguida, vieram os cortes. De um orçamento anual de 10 bilhões de reais MCTI, hoje está reduzido a R$ 2,5 bilhões. O orçamento do CNPq é composto por duas fontes: o orçamento do Tesouro Nacional, aprovado no Congresso Nacional todo ano. Para 2017, foi cerca de 1,3 bilhão de reais, e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o FNDCT. Este com uma previsão inicial de 400 milhões de reais para 2017. Somam as duas fontes, portanto, 1,7 bilhão de reais.

De acordo com o Painel de Investimento do CNPq, as dotações para pesquisa, na contramão dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, são tão pequenas que quase desaparecem dos gráficos nos últimos dois anos. O número total de bolsas também caiu cerca de 10% desde 2015, de aproximadamente 100 mil para 90 mil. Grande parte dessa queda, registra o Painel, deve-se ao fim do programa Ciência sem Fronteiras, que inflou os números de 2012 a 2015, mas há também perda relacionada à redução do número de chamadas (editais) abertas pelo CNPq nos últimos dois anos. Muitas delas contemplando concessão de bolsas para projetos de pesquisa.

O setor é vítima de uma política fiscal irresponsável do governo federal que, nos últimos quinze anos, priorizou elevar, sem lastro orçamentário compatível, a criação de novas universidades, o aumento irreal de bolsas e de programas sociais de forte apelo popular. Com a crise descobriu que não tinha como sustentar os comprometimentos assumidos. Em consequência, o país quase quebra. Não só o CNPq, mas praticamente todos os órgãos técnicos federais, com graves reflexos sobre estados e municípios. Em síntese, enquanto setores estratégicos da economia brasileira sangram, a nação assiste, indefesa, saques aos cofres públicos bilionários em montantes jamais antes vistos na história deste país. Que contra-senso.
Manaus, 6 de novembro de 2017.

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