
Paulo Figueiredo
Ainda que aos trancos e barrancos, o Brasil vem mudando. Até bem pouco tempo, seria inimaginável a prisão em Bangu de dois ex-governadores do Rio de Janeiro, segundo maior estado da Federação. Difícil acreditar que o ex-presidente Lula da Silva, morubixaba do PT e do lulopetismo, seria conduzido à força para prestar depoimento na Polícia Federal. Mais ainda, que responderia a mais de um processo por corrupção e outros delitos, prestes a ser julgado e condenado, diante da evidência dos crimes que cometeu.
Como admitir que o ex-presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, também ocuparia uma das celas postas à disposição da Lava-Jato em Curitiba, próximo do preso Marcelo Odebrecht, rico e poderoso, presidente da maior empreiteira do país. Antes, Delcídio Amaral, senador no exercício do mandato, não tivera melhor sorte, recolhido em flagrante delito e levado pelas circunstâncias a prestar delação premiada, com a qual entregou muitos de seus parceiros delinquentes.

Há vários políticos com investigação em curso no Supremo Tribunal Federal – STF, dentre eles, o notório Renan Calheiros, presidente do Senado e do Congresso Nacional. Urge que o STF acelere o andamento dos casos sob sua jurisdição. Outros, como Romero Jucá, foram obrigados a deixar funções relevantes no governo Temer, que vê as operações policiais alcançarem expressões importantes de seu partido, o PMDB. Fala-se, com apoio em informações seguras e indesmentíveis, que os depoimentos dos executivos e do próprio presidente da Odebrecht não deixarã ;o pedra sobre pedra, compondo o que vem sendo chamado de delação do fim do mundo.
Estima-se que algo em torno de 40% de parlamentares com mandato em Brasília ilustram as páginas das declarações dos diretores da empresa. Tal fato tem motivado ação legislativa articulada na Câmara e no Senado, a fim de conter ou sepultar de vez os procedimentos investigatórios contra a classe política. Neste ponto, todo cuidado é pouco, porquanto pode ocorrer com a Lava-Jato o que aconteceu com a Mani Pulite na Itália, castrada pela edição de uma série de normas legais de proteção aos corruptos italianos. Sem ampla mobilização popular, com igual ou maior dimensão das manifestações de protesto de junho de 2013, todo o trabalho do juiz Sérgio Moro e de outros magistrados pode muito bem escorrer por águas abaixo.
À medida que a Lava-Jato sai de seu núcleo mais evidente e espraia-se no sentido dos estados da Federação, identificada a participação de ex-governadores em esquemas criminosos, crescem as resistências às operações moralizadoras e punitivas. A corrupção é nacional e vai do Amazonas ao Rio Grande do Sul, com o Brasil em estado de coma. No sentido Norte-Nordeste, em proporções bem mais profundas, praticam-se percentuais que fariam corar assaltantes profissionais do erário em regiões mais desenvolvidas do país. Surgem da noite para o dia fortunas criminosas, que premiam a incompetência já testada e fracassada longe do universo da política. Tudo é amealhado em milhões e milhões de dólares, em contas no exterior, ou em milhões e milhões de reais, traduzidos em patrimônios fantásticos registrados em nome de laranjas.
Se no Rio de Janeiro surpreende o conjunto de bens de propriedade do ex-governador Sérgio Cabral e de seu consorte Antony Garotinho, será fácil imaginar o que a Lava-Jato e outras iniciativas laterais ou derivadas encontrarão no mapa do Brasil acima. Antes ambos não tinham um tostão de mel coado, segundo setores bem informados da população de seus estados, e agora ostentam a condição de milionários, sem nada que justifique o acúmulo de tanta riqueza. É um escárnio, tamanha agressão aos cofres do erário, notadamente em estados com graves carências sociais, em áreas nevr&a acute;lgicas, como em matéria de saúde, educação, transporte e segurança pública.
Mas o que conforta é que todos serão apanhados pela Justiça, como já o foram Cabral e Garotinho, e como serão tantos outros ex-governadores em situação semelhante. Pelo andar da carruagem, bem mais cedo do que poderiam supor. Agora, com o concurso decisivo da Receita Federal e de seus auditores, detecta-se a evolução patrimonial sem fundamento sólido ou origem legal dos incriminados.
Somente assim será possível passar o Brasil a limpo, varrendo o lixo da corrupção e seus conhecidos atores, em defesa da ética na política, uma vez que somente assim seremos capazes de integrar o processo civilizatório, no concerto das nações desenvolvidas.(Paulo Figueiredo é Advogado, Escritor e Comentarista Político – [email protected])