Exército brasileiro começa a treinar mulheres para o front

Exército brasileira começa a treinar mulheres para o front (Projeto EsPCEx/ Facebook/Divulgação)

“Fogo à vontade!”, diz um tenente do Exército, erguendo o braço esquerdo, e o que se ouve depois é ensurdecedor. Em menos de um minuto, 88 tiros de fuzil, rajada que encobre a voz do tenente, o ruído dos quero-queros ali perto, os carros da rodovia ao longe. O vento traz um pouco de gás lacrimogêneo, que faz arder olhos e nariz, e a orientação é respirar normalmente.


Nada anormal no treino de tiro do Exército, nesta terça-feira, 22, na escola preparatória de Campinas (SP). Há, porém, na fileira de jovens alunos de 17 a 22 anos, de barriga no chão, dedo no gatilho e rostos camuflados, um detalhe impensável pouco tempo atrás: um conjunto de tranças bem firmes, de cabelos claros e escuros, que despontam dos capacetes balísticos e se movem com o forte recuo dos disparos.

Aqui, deitadas no chão, empunhando fuzis automáticos leves (FAL), estão as primeiras mulheres brasileiras a serem treinadas para combate pelo Exército do Brasil – uma instituição fundada em 1648 que, agora, parece querer tirar o atraso.

Exército brasileira começa a treinar mulheres para o front (Projeto EsPCEx/ Facebook/Divulgação)

Desde fevereiro, 37 alunas frequentam a escola campineira, porta de entrada para a formação de oficiais combatentes, inaugurando a presença feminina na linha bélica da força.

Aeronáutica e Marinha já formam mulheres oficiais, respectivamente, desde 1996 e 2014. No Exército, elas compunham apenas quadros auxiliares, em funções administrativas ou de saúde – houve um aumento de 82% no número delas na Força em dez anos (4.447 em 2006, ante 8.110 no ano passado), mas eram só nos quadros complementares.

A partir de agora, elas finalmente podem treinar para o combate, prosseguir para a Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) e ter condições de ascender – levará décadas, mas agora podem – ao posto de general.

Esta é semana da instrução de tiro em Campinas, quando todos os 420 alunos se dedicam a esburacar a fileira de 20 alvos a até 100 metros. Atirando apoiada no joelho direito está Sarah Cassani Leite, de 18 anos, uma das alunas que, até o ano passado, só estudava para o vestibular e nunca havia pensado em seguir carreira militar.

Foi aprovada na USP (Engenharia Bioquímica), Unicamp e Unesp (Engenharia Química), mas – para surpresa dos pais, não militares – escolheu cursar a Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx). “Optei por ela porque seria uma honra fazer parte do momento em que o Exército acreditou no potencial da mulher”, diz a jovem em um intervalo no treinamento.

Eram 11h, Sarah havia passado a noite em claro, em serviço de guarda, e desde o nascer do sol participava de exercícios como pistas de obstáculos de 400 metros, além das séries de tiros. “Representamos a força que toda mulher tem, um Brasil mais inteligente e inclusivo, e não vamos decepcionar.”

A escola se preparou para receber as alunas ao longo do ano passado – o que incluiu o que foi chamado, dentro do Exército, de “situações extraordinárias”. Era tudo aquilo com o qual os militares nunca haviam lidado: namoro entre alunos (pode, desde que o comandante seja informado e que não demonstrem a relação afetiva dentro da escola), gravidez (pede-se uma licença), menstruação (o médico avalia casos em que a aluna não se sinta apta a treinos físicos).

“Foram as discussões mais demoradas, pois nada disso era previsto em regulamento”, explica o coronel Marcus Alexandre Fernandes de Araújo, comandante da EsPCEx.

Para auxiliar no preparo, foram convocadas oito militares mulheres – três tenentes e cinco sargentos de outros lugares do Brasil. Elas percorreram as academias da Aeronáutica e da Marinha, que já têm essa experiência. “Uma das questões a esclarecer foi o índice a ser alcançado para instruções físicas, que não pode ser igual para homens e mulheres, por causa das diferenças de biotipo entre os sexos”, diz a tenente Vanessa Jorge, uma das instrutoras que vieram a Campinas.

“A medida é o esforço. Há estudos que quantificam quanto se exige para uma tarefa, e com base neles definimos o que é o equivalente para cada sexo. O esforço para um homem fazer 20 flexões, por exemplo, pode ser o equivalente ao que uma mulher gasta para 10.”

Fonte: Exame

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