Mordomias do metalúrgico (Por Paulo Figueiredo)

Advogado Paulo Figueiredo (AM)

“O apartamento que hospedará o Palestrante deverá conter, no mínimo, os seguintes ambientes independentes, porém interligados: dormitório com banheiro, sala de estar e sala de reunião com banheiro. Dormitório: cama king size, menu de travesseiros. Sala de estar: sofás para, no mínimo, 6 pessoas. Sala de reunião: mesa de reunião para, no mínimo, 6 pessoas. Alimentos e bebidas (uísque 50 anos, champanhes e vinhos como Romanée Conti, superiores ao que abriu e tomou com Duda Mendonça, ao celebrar sua primeira eleição presidencial?) no quarto: frutas, pães, queijos (fr anceses?), frios, castanhas, água, refrigerantes normais e do tipo ‘zero’. Serviços exclusivos de quarto 24 horas”.
O texto aí de cima, sem tirar nem pôr, segundo a revista Época, lista as exigências a serem cumpridas pelos hotéis 5 estrelas ou de nível mais elevado, como condição para que pudessem hospedar o palestrante Luiz Inácio Lula da Silva, em seus périplos pela África e América Latina, a serviço da empreiteira Odebrecht. A empresa, independente do pagamento de algo em torno de R$ 4 milhões ao metalúrgico, pelas “palestras”, assim entre aspas, ainda suportou gastos da ordem de mais de R$ 3 milhões, com fretes de jatos executivos, palácios no ar, despesas de hospedagem, desl ocamentos e outras. Como acompanhante, Lula tinha sempre a presença indefectível de Alexandrino Alencar, diretor e conhecido lobista da construtora, preso por mais de quatro meses pelo juiz Sérgio Moro, agora livre por decisão do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, sem nenhuma surpresa.


Em notável trabalho jornalístico, Época registra a estranha coincidência entre as viagens de Lula e a liberação de recursos pelo BNDES aos países visitados, numa triangulação que beneficiava a Odebrecht, como titular de contratos de obras em Cuba, Venezuela, Argentina, República Dominicana, Angola, Guiné Equatorial, Gana e outros. Muitos bilhões de reais escoaram pelo ralo em financiamentos de retorno duvidoso. Alguns, já inadimplentes, tiveram liberação assegurada em várias etapas, com a marca da ingerência incerimoniosa do antigo metalúrgico, hoje magnata, verdadeiro ma ndarim dos trópicos, que não abre mão de usufruir das mordomias e do conforto propiciado em hotéis de altíssimo luxo pelo mundo afora.

Logo após deixar a presidência, Lula pôs-se a serviço da Odebrecht, com bela remuneração, somada a outras benesses, diretas e indiretas. Talvez em decorrência de certo complexo atávico de inferioridade, impressiona a identidade do ex-presidente com essa gente, que nunca ganhou tanto dinheiro como em seu governo. Foi-se o tempo da cachaça ordinária, com lascas de jabá, arrancadas à unha, na taberna ou no botequim da esquina, com sindicalistas do tempo do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Foi-se o tempo da casa de 40 metros quadrados, residência em estado precário de sua família, onde o p romotor Hélio Bicudo o conheceu. As lembranças do quartinho no convento de Frei Beto, que fez questão de dizer a Lula que continua vivendo no mesmo local, enquanto muitos de seus companheiros de aventura do passado refestelam-se na riqueza de origem criminosa, já não mais o incomodam. Não há sequer memória dessa época. Foi espanada. Presta-se apenas para formulações demagógicas, típicas de palanque, porquanto distantes da realidade do dia a dia do mandarinato do metalúrgico.

Lula e sua família, mulher, filhos, noras, parentes e agregados de ocasião, amealharam uma fortuna incompatível com sua modesta história de vida e seus parcos recursos financeiros, auferidos no exercício de cargos públicos. Agora, vive à tripa forra e move-se em espaços reservados, frequentados pela elite da elite, que tanto diz condenar no discurso, embora adore e faça questão de desfrutar sem limites do conforto que sua nova posição social lhe proporciona. Ainda segundo Hélio Bicudo, seu velho companheiro de chapa, lá atrás, derrotados na disputa pelo governo de São Paulo, trata-se de um dos homens mais ricos do Brasil, sem que ninguém investigue em que circunstâncias conquistou status de tamanha opulência.

Apesar dos pesares e da herança histórica que etiqueta o país como paraíso da impunidade, fecha-se em boa hora o cerco sobre Lula, que conseguiu escapar do Mensalão, embora tenha tido sempre o real domínio dos fatos, como presidente, bem acima de José Dirceu. Já foi ouvido pelo Ministério Público em Brasília, em cima de dados concretos e irrespondíveis, fruto de relações perigosas com o mundo do crime contra o erário, presentes em depoimentos recolhidos em delações premiadas. Logo deverá cair na ampla malha da Operação Lava Jato. No Petrolão, sob a mesma condição de mandatário maior da República, que dava a última palavra na composição do comando da Petrobras, também deixou a impressão de suas digitais, ao aparelhar a empresa com assaltantes que privavam de sua intimidade, em nome de interesses próprios e de seu partido político.(Paulo Figueiredo – Advogado, Escritor e Comentarista Político – [email protected])

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