O feijão, o fuzil e a democracia – por Carlos Santiago

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado

Fazendo um discurso em homenagem aos primeiros mortos da Guerra do Peloponeso, Péricles, o grande estratego ateniense, ensina que o homem que é alheio às atividades públicas, não é só alguém que cuida dos próprios interesses, mas trata-se de um verdadeiro inútil. Ampliando as palavras do orador grego, chamo o inútil de flagelador da cidadania e da democracia.


Recentemente, o Presidente do Brasil deu uma declaração que demonstra sua clara estupidez humana, seu alheamento às questões de interesse público, de descompromisso com a cidadania e com a democracia. Ao dizer que prefere fuzil a feijão, Bolsonaro, não só demonstrou ser um desconhecedor da cultura brasileira e da fragilidade econômica pela qual passam os brasileiros, mas ainda pior, revelou-se um verdadeiro inútil.

Qualquer pessoa que não seja alienada, não seja um fã do Presidente da República ou não o canonize, vai ver que, atualmente, o “preço do feijão não cabe no poema…”, e que vem a cada dia desaparecendo da mesa do brasileiro. Pra não dizer que não falei das flores, também está deixando de caber no poema, o preço do arroz, da carne, da farinha, das frutas, da gasolina e tudo mais.

Carioca, Preto, Branco, Fradinho, Cavalo, Rajado, Jalo, Rosinha, Azuki, manteiga, Roxinho, Mulatinho, Vermelho…, o feijão está no centro e na periferia da história e da cultura brasileira. Ingrediente que ata pelo estômago e pelo sabor as diversas regiões e as mais diferentes concepções de vida e de mundo, não resta dúvida de que ele representa o maior símbolo de cidadania que nós temos.

Unanimidade entre as unanimidades, já foi chamado de maravilha. Querido ontem, hoje e sempre, seu gosto tem sabor de aventura, por isso, diz a música: “… dez entre dez brasileiros preferem… e elegem feijão. ” Uma democracia faminta de comida, carece de feijão e de cidadania. Morte da morte, ele mata a fome e prolonga a vida.

Não é à toa que a feijoada, nosso mais conhecido prato nacional, tem como ingrediente principal o feijão, daí o nome dessa gostosura alimentar. Prato nacional, ela foi usada pelos modernistas como elemento-chave para a construção de uma identidade nacional brasileira. Antropofagicamente, a feijoada seria um signo de brasilidade, assim como alegoria da cozinha nacional e visgo das diversas etnias nacionais.

Enquanto o feijão traz à mente o significado de sustança, festa, alegria, brasilidade, fartura, cidadania, diálogo, democracia e igualdade; simbolizando algo forte, mesa farta, alimento que todos os lares devem ter. O fuzil é a morte, não só das pessoas, mas da democracia, pois o seu uso pressupõe a falta de diálogo e o uso do poder do mais forte sobre o mais fraco. Implica a imposição de uma vontade frente à vontade da maioria.

Inútil é o governante que dificulta o exercício da participação popular, aumenta a exclusão social e fragiliza os direitos dos cidadãos. O Brasil tem fome de comida, de cidadania e de democracia. Titânicas são as interrogações: Você tem sede de quê? Você tem fome de quê? Agonizante, a resposta: comida, diversão, arte, amor e vida. Só um inútil escolhe o fuzil para ser símbolo do seu governo.

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado.

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