O moço da camisa rosa – por Valdir Fachini

Articulista Valdir Fachini (SP)

E lá vinha ele descendo a rua, todo pintoso, cheio de graça e charme com sua camisa cor de rosa. Ele gostava dessa cor, naquela época, homem que usava roupa rosa, o pessoal chamava de baitola, maricona e mais uma centena de adjetivos, mas ele não estava nem aí.
As mulheres todas suspiravam por ele, as solteiras disputavam ele no palitinho, as casadas se arrependiam de não ter esperado, as velhas se lamentavam por ter que ostentar suas inúmeras rugas, as meninas colocavam enchimento no sutiã para parecer mais velhas, acho que até a alma das defuntas no cemitério tinha uma quedinha por ele;


Os homens da cidade se descabelavam de ciúme dele, mas até que foi bom, por que eles começaram a se arrumar melhor. O estoque de fazenda rosa da cidade acabou, trocaram as velhas botinas por sapatos de pelica que custavam o olho da cara, passaram a fazer barba e tomar banho todo dia, ficaram até jeitosinhos, alguns até arrumaram namorada depois da mudança.

Teve macho que chegou a dizer que se fosse mulher iria dar em cima dele.

Uma tarde, bem de tardezinha mesmo, quando os últimos raios de sol já se escondiam atrás da montanha, os rapazes e as moças começaram a dar volta em volta da fonte luminosa (naquela época, toda praça em frente a matriz tinha uma) as moças iam por um lado, os moços iam pelo outro, de modo que todos eles se encontravam com todas elas, só o Tertuliano não ia para lugar nenhum, ficava parado feito dois de paus.

Articulista Valdir Fachini (SP)

Numa dessas voltas ele me deu uma olhada comprida, tão comprida que eu me arrepiei, na segunda volta de novo, na terceira ele repetiu a olhada, na quarta vez eu parei, fui perto dele, cumprimentei e falei só para ele ouvir, …olha aqui, cara! O meu negócio é mulher, eu não gosto de viadagem não e voltei a voltear.

Ai, eu me toquei, se eu notei que ele estava me olhando, é porquê eu olhava para ele também, o que está acontecendo comigo?

Comecei a me preocupar com a minha macheza, pior foi perceber que as moças do volteio já não me chamavam a atenção, do outro lado da fonte eu procurava com o olhar pelo moço da vestimenta rosa, mas a maioria dos mancebos já estavam usando rosa, meus passos se apressavam quando eu estava longe, mas quando eu chegava perto eles iam em câmera lenta.

Alguma tarde depois, eu estava sentado num banco da mesma praça, a sombra de um pé de tamarindo, quando eu o vi se aproximando, confesso que tremi, Ele sentou do meu lado e tentou me acalmar, então com uma voz macia ele me disse…eu sou mulher.

Eu nasci assim com esse jeito masculino, mas não sou homem e nem quero ser, isso foi um erro da genética, tenho pelo por todo o corpo e essa barbinha ridícula que eu procuro manter sempre aparada.

Não tenho amigos, tenho medo de ter amigos e depois não ser aceita quando descobrirem como sou de verdade.

Então eu me propus a ser seu amigo, não sei se por dó ou afeição, mas acabei sendo seu grande amigo e ela minha melhor amiga, talvez a única.

Chorei, quando um dia ela se mudou com a família para outra cidade, fiz festa quando um ano mais tarde ela voltou, muito mais amiga ainda.

Essa história se passou a muito tempo atrás, tenho saudades daqueles momentos.

Hoje eu estou casado, sou feliz e amo demais a minha esposa e tenho três filhas ……todas barbadas.

 

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