Para Marilena Chauí o Brasil está entre a carência e o privilégio

Para Marilena Chaui, polarização no país é entre a carência e o privilégio/Foto Reprodução TVT

Para a filósofa e professora Emérita da Universidade de São Paulo (USP) no programa Entre Vistas, da TVT, apresentado na última terça-feira (17) pelo jornalista Juca Kfouri. É essa polarização que move a ideologia de “desmontar” programas de promoção de igualdade. “E enquanto o trabalhador não se percebe como excluído e oprimido, não vai à luta”


A tão falada nos últimos anos, a polarização no cenário sociopolítico do Brasil é comumente explicada pela dicotomia direita x esquerda, ou PT x PSDB, como partidos representantes destes dois espectros políticos. Para a filósofa Marilena Chauí, entretanto, a polarização do país é melhor compreendida quando analisada como sendo o embate entre quem sofre da carência absoluta e quem detém os privilégios.

Por esse olhar, a carência individual ou coletiva, quando resolvida, acaba, enquanto o privilégio é permanente. Entre um e outro, há o campo dos direitos civis, sociais e econômicos, que são universais. “Os direitos se opõem à carência e também ao privilégio, e por isso a sociedade está polarizada e não consegue avançar nestes direitos que são resultados de anos de luta dos movimentos sociais e partidos de esquerda”, explicou a filósofa.

É desse modo que Marilena Chaui interpreta o papel da classe média brasileira, que vê os direitos sociais como obstáculos a sua ambição de ascender à elite. “A idéia de que é um direito humano as pessoas fazerem três refeições por dia, é insuportável para a classe dominante”, ironiza. Para ela, inclusive, a classe média se arrependeu do impeachment de Dilma Rousseff, embora não goste de confessar.

“É impossível que ela (a classe média) não veja todos os dias os resultados do governo Temer. Há essa percepção, mas ela é razoavelmente enrustida. Se você der visibilidade para o equívoco, a classe média recua. Acho que ela se deu conta de que foi um passo equivocado”, analisou Marilena Chauí.

Para Marilena Chaui, polarização no país é entre a carência e o privilégio/Foto Reprodução TVT

Durante o Entre Vistas, ela citou pesquisas acadêmicas que estudam os efeitos do Bolsa Família na região Norte e Nordeste, um dos programas sociais criticados por parte da sociedade brasileira. Entre os efeitos positivos estão a reestruturação da vida familiar, colocando em igualdade o homem e a mulher como consequência do benefício ser pago para ela; e a atividade econômica impulsionada na região com os recursos do programa. “As pessoas não se deram conta da revolução econômica, social e antropológica do Bolsa Família”, afirmou.

Para a professora emérita da USP, os avanços sociais e econômicos obtidos durante os governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff não levaram ao surgimento de uma “nova classe média”. O que teria havido foi o surgimento de uma nova classe trabalhadora, já assimilada aos valores do individualismo e do “empresário de si mesmo”, ideias características do neoliberalismo. Segundo a filósofa, a esquerda brasileira precisa olhar e compreender essa nova classe social e ponderou que, nessas circunstâncias, enquanto o trabalhador não se perceber como excluído e oprimido, ele não irá “pra luta”.

Brasil quintal

Aos 76 anos, Marilena Chaui recordou ter visto, ao longo da sua vida, a democracia no Brasil ter sido periodicamente “cortada”, como nos casos do suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, no golpe civil-militar de 1964 e agora no impeachment de Dilma Rousseff. Para ela, o país voltou a ocupar a posição de “quintal, onde cada um joga o lixo que quiser”.

Com pesar, ela comparou a postura altiva que o Brasil outrora assumiu no processo de criação do Brics (bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Mercosul, UNASUL, G20 e participação no G8 com o momento atual, que mescla a atitude de subordinação com a humilhação.

“Não é por acaso que o primeiro ato (pós-impeachment) foi quebrar a política externa, quebrar nossa autonomia e economia entregando nossas riquezas para as empresas internacionais. O pré-sal poderia deixar o país de cabeça erguida em 50 anos, e hoje tudo é entregue a quem quiser e der mais”, criticou, citando possibilidades de investimentos em energia, tecnologia espacial e educação desperdiçadas.

Fonte: Rede Brasil Atual RBA

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