Políticos – por Flávio Lauria

Flávio Lauria é Administrador de Empresas e Professor Universitário

Se os políticos praticassem individualmente contra seus eleitores os desaforos e as fraudes que lhes infligem coletivamente, certamente seriam hoje uma espécie extinta, pois de um ou de outro já teriam recebido o troco que merecem. Mas eles agem coletivamente. Quer dizer, ocultamente. Ocultos pelo anonimato, protegidos pela abstração das instituições: O Estado, O Fisco, A Câmara, O Congresso, A Prefeitura, O Judiciário. Abrigados sob o anonimato dessas pomposas, temíveis e inefáveis estruturas convencionais e abstratas, não há como identificá-los, individualizá-los, personalizá-los, nomeá-los, vê-los, botar as mãos em cima deles.


Embora por baixo ou por cima dessas instituições o que se acha são indivíduos em iguais aos seus eleitores – salvo nos privilégios e imunidades que se auto outorgam. Entretanto, só eles se conhecem, se identificam, se personalizam. Só eles estão inteirados de suas vantagens e falcatruas. Investidos de seu mandato, de seus privilégios e de suas imunidades, não há como o eleitorado, e muito menos o eleitor, individual, alcançá-los.

A ficção democrática os investe da soberania: eles são “os representantes do povo”, sua voz, seu desejo, seu poder. A ideologia democrática diz que eles são o poder maior, absoluto, incontestável. Acima do povo ou contra ele, que poder maior pode se impor? São eles que fazem as leis, são eles que estruturam a Justiça e comandam a Polícia, os fiscais, e todos os demais aparelhos legais de coerção e repressão.

Sem dúvida, a Ética, o Direito, a Constituição, se acham acima deles. Na prática, os instrumentos de operação social desses valores são imponderáveis e impotentes. Existe, inegavelmente, uma Opinião que exprime o pensamento, os sentimentos e o desejo da maioria. Existem a Mídia, os Tribunais de Contas, os Ministérios e Promotorias públicos. Mas sabe-se bem o limite de ação prática desses instrumentos e a que ponto a política e o Estado os controla e manipula.

Assim, o único corretivo contra as deformidades, abusos e degenerações da Política está nas mãos dos próprios políticos. E nada existe mais poderoso, mais salutar e mais produtivo para a melhoria dos costumes políticos do que as brigas de família entre eles. Só eles conhecem seus próprios podres e suas próprias fraquezas e só eles têm o poder de corrigi-los. Daí a salubridade das comissões de inquérito. Daí, também, a prontidão com que eles tratam de encerrá-las o quanto antes e minimizar seus efeitos. Hodi mihi, cras tibi.

Embora a maioria dos políticos ignore o latim, nenhum deles desconhece esse ditado: Hoje eu, amanhã você. E, como todos têm os rabos trançados no mesmo rolo de minhocas, nenhuma Máfia observa com maior escrúpulo e temor a regra da Omertà – o silêncio da cumplicidade que a ameaça da retribuição assegura. Hoje se denomina de corporativismo a esse espírito de defesa grupal.

As corporações eram instituições de ofício medievais. Mas a coisa é mais antiga e mais profunda do que isso. Os etnólogos a conheciam por tribalismo e os zoólogos por instinto grupal. Em nenhum grupo humano esse instinto é mais forte do que na manada política. A razão é simples. Zoologicamente eles pertencem à variedade animal dos predadores e, se nesse tipo de bicho não predominar o instinto grupal, sua sobrevivência estará ameaçada.

É por isso que lobo não come lobo e os leões vivem em paz entre si. Piranha também não come piranha. Salvo se uma delas for sangrada. Na política, o processo de criar bodes expiatórios é um sistema de preservar a tribo e o próprio bode. Mesmo depois de mortos eles voltam como heroicos ectoplasmas para retomar seu lugar no cocho.

Não vão os pundonoros e os pudibundos políticos brasileiros, considerar ofensivas as palavras deste artigo. Elas são inferiores em contundência à gravidade dos fatos que praticam contra seus eleitores e representados. Teríamos melhor segurança, melhor educação, melhor saúde se os milhões por eles embolsados chegassem ao destino para os quais os pagamos. Pois o problema não é o de “quanto” se arrecada, mas o de como se “gasta”. Sem os furtos políticos do último quarto de século, este já seria um país do Primeiro Mundo.

 

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