
Desde seu nascimento, a corrupção persegue nossa Nação. Já no primeiro documento escrito no País, a Carta de Pero Vaz de Caminha – além de tecer loas à nova terra descoberta -, o autor encaminha um pedido a d. Manuel, o Venturoso, para interceder por um parente. Embora convivendo durante meio milênio com este hábito arraigado, o povo brasileiro nunca deixou de se indignar contra a corrupção, em todas as suas formas: do jeitinho brasileiro aos milionários esquemas de sangria do Erário.
A ânsia de uns em prover interesses próprios em detrimento do bem-estar de todos já está presente, também, no sermão do Bom Ladrão, do padre Antônio Vieira, quando afirma: “Perde-se o Brasil (digamo-lo em uma palavra) porque alguns ministros de Sua Majestade não vêm cá buscar nosso bem, vêm cá buscar nossos bens.” E quem quiser conhecer um pouco mais sobre a corrupção nos tempos do Brasil Colônia pode recorrer ao clássico Arte de Furtar, atribuído ao padre Vieira, que descreve, entre outros ardis, o caso dos soldados fantasmas.
Alguns coronéis portugueses corruptos embolsavam os cruzados da Coroa, destinados ao recrutamento de soldados, preenchendo registros com nomes falsos e inexistentes. O povo brasileiro já enfrentou muitos pântanos morais, de onde saiu limpo e redivivo, com a ética resgatada e fortalecida. Na época do impeachment do então presidente Fernando Collor, em 1992, muitos alarmistas previam que o impedimento do chefe do Executivo levaria o País junto consigo. Mas, pelo contrário, o pedido de impedimento encaminhado pela OAB e ABI, as manifestações dos caras-pintadas que foram às ruas, a população que externou sua indignação através do “luto” da rejeição e a imprensa – que foi até as últimas consequências do direito social à informação – propiciaram uma aula de cidadania e de fortalecimento da democracia brasileira.
Novamente, o impeachment de uma governante se apresentou à população brasileira. ilhada por um oceano de denúncias por prática de ilícitos, imputadas a chefe do Executivo evou ao impedimento de Dilma Rousseff. Os brasileiros, ao longo dos mais de 500 anos, evoluíram eticamente. Se, antes, tolerávamos políticos que “roubavam, mas faziam”, hoje defendemos a drástica punição para quem pratica a improbidade administrativa. Ampliou-se nossa consciência como cidadãos, que sabem cobrar responsabilidade dos governantes.
O processo de impedimento difere do processo judicial, por implicar um julgamento de natureza política. De acordo com ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, Paulo Brossard, “o impeachment tem feição política, não se origina senão de causas políticas, objetiva resultados políticos, é instaurado sob considerações de ordem política e julgado segundo critérios políticos – julgamento que não exclui, antes supõe, é óbvio, a adoção de critérios jurídicos”. Por ser um instituto político, propiciará respostas mais rápidas, ansiadas pela população, do que um processo jurídico. E a abertura do processo permitirá ao prefeito promover a defesa das denúncias que lhe são imputadas. Se inocente, sairá fortalecido com plenas condições de governabilidade. Se culpado, será cassado, sem possibilidade de recurso.