Saiba o que pensam os que não acreditam que o homem chegou à Lua

Neil Armstrong na Lua em 1969 — Foto: Nasa/Divulgação

Cinquenta anos depois de o astronauta Neil Armstrong (1930-2012) ter dado aquele “pequeno passo para o homem, grande passo para a humanidade”, ainda há muita gente que não acredita que um ser humano – para ser mais exato, 12, em seis viagens diferentes da missão Apollo – pisou na Lua.


Teorias conspiratórias de diferentes níveis de complexidade estão a um clique do mouse. E, em tempos de fácil propagação de notícias falsas em redes sociais, ganham fôlego online.
“Não adianta tentar rebater uma teoria da conspiração porque outra vai aparecer logo após. Por isso o melhor é voltar ao início e ver como aconteceu a corrida espacial”, o físico e engenheiro brasileiro Ivair Gontijo, cientista da Nasa, a agência espacial americana.
“Muitas pessoas tem dúvidas legítimas e querem entender, mas quando procuram pelo assunto na internet, acabam achando mais teorias da conspiração e ficando mais confusas ainda.”

De tempos em tempos, diversas pesquisas de opinião são realizadas pelo mundo para medir o quanto as pessoas acreditam no sucesso das missões Apollo. O nível de descrença varia de 6% a 57% – este último impressionante número é de levantamento divulgado ano passado pelo VTsIOM, o instituto nacional de pesquisas de opinião da Rússia, e deve refletir sobretudo os esforços de contrapropaganda da Guerra Fria, quando a então União Soviética era rival dos Estados Unidos na chamada corrida espacial.

Objetivo da Nasa é voltar à Lua até 2024 e preparar o primeiro envio de seres humanos a Marte — Foto: Divulgação/Nasa

Levantamento semelhante realizado pelo instituto Gallup nos Estados Unidos apontou que 6% dos americanos não acreditam que o homem tenha pisado na Lua. Mas outras sondagens chegam a apontar que esse número pode ser bem maior: na casa dos 20%.
De acordo com pesquisa recente realizada pela empresa YouGov, um em cada seis britânicos acredita que a conquista da Lua foi encenada. E, entre os jovens de até 35 anos, “informados” intensamente por canais de YouTube e fóruns de internet, esse número é ainda maior: 21%.

Vamos aos fatos, portanto. Não tem conspiração. Até hoje, 12 pessoas pisaram na Lua.

Todos homens, todos norte-americanos. Na ordem:
• Neil Armstrong e Buzz Aldrin (Apollo 11, por 2h31, em 21 de julho de 1969);
• Pete Conrad e Alan Bean (Apollo 12, por 7h45, em 19 de novembro de 1969);
• Alan Shepard e Edgard Mitchell (Apollo 14, por 9h21, nos dias 5 e 6 de fevereiro de 1971);
• David Scott e James Irwin (Apollo 15, entre 31 e 2 de agosto de 1971, sendo que o primeiro caminhou em solo lunar por um total de 19h03 e o segundo, por 18h33);
• John Young e Charles Duke (Apollo 16, por 20h14, entre 21 e 23 de abril de 1972); e
• Eugene Cernan e Harrison Schmitt (Apollo 17, por 22h02, de 11 a 14 de dezembro de 1972).

Contra os fatos

Os argumentos são os mais variados possíveis. Em fóruns de internet há desde gente defendendo que seria impossível pisar na Lua porque ela se trata de “uma bola de luz” até outros tentando provar por A mais B que até seria possível levar o homem até lá – o problema, segundo eles, seria fazer o caminho de volta para a Terra.

Dono de um famoso podcast, o comediante americano Joe Rogan está entre os disseminadores de teorias da conspiração. Seu argumento mais convincente, conforme já afirmou, parece ser o mero prazer que tem em duvidar das coisas. “Eu tenho uma relação de amor e ódio com teorias da conspiração”, disse ele, em uma de suas apresentações.

No YouTube, uma potente voz dos conspiradores é o canal de outro comediante americano, Shane Dawson. Seu vídeo defendendo que o homem nunca pisou na Lua tem 6min22s e mais de 7 milhões de visualizações.

O americano Buzz Aldrin foi um dos austronautas caminhou sobre a Lua-Foto: Divulgação/Nasa

Mesmo repaginados, os conspiracionistas atuais bebem na mesma velha fonte. Os mais antigos registros de teorias da conspiração sobre a chegada do homem à Lua estão no livro “We Never Went to the Moon: America’s Thirty Billion Dollar Swindle” (em tradução livre para o português, ‘Nós Nunca Fomos à Lua: A Fraude Americana de 30 Bilhões de Dólares’), escrito pelo ex-oficial da Marinha americana Bill Kaysing (1922-2005).

Com a experiência de ter trabalhado na fábrica de foguetes Rocketdyne entre 1956 e 1963, Kaysing começou a defender que as alunissagens do projeto Apollo haviam sido forjadas pelo governo americano. No livro, ele afirma que as chances de um pouso bem-sucedido no satélite terrestre eram de parcos 0,0017% e, no auge da Guerra Fria, era mais fácil para os Estados Unidos falsificar um resultado do tipo do que ir efetivamente para a Lua.

Segundo Gontijo, uma tremenda bobagem. “Os russos, maiores competidores dos americanos, nunca denunciaram as viagens à lua como farsa”, argumenta ele. “Eles sabiam muito bem o estado da tecnologia da época porque estavam tentando fazer o mesmo. E seus cientistas e engenheiro jamais levantaram dúvidas sobre o sucesso dos americanos.”

Mas os conspiracionistas ganhariam novo fôlego no início dos anos 1980, com a entrada, no debate, da Sociedade da Terra Plana. Os terraplanistas, que argumentam que a Terra e a Lua são planas, afirmam que a Nasa criou uma falsificação com ajuda do cinema. A Nasa teria, sob o patrocínio dos estúdios Walt Disney, contratado o diretor Stanley Kubrick (1928-1999) para forjar as cenas dos astronautas em solo lunar.

“Se fosse para somente encenar, por que fazer isso tantas vezes? Por que não fazer uma vez só?”, rebate o brasileiro Gontijo.

Um outro argumento que faz inferir a impossibilidade de fraudar um projeto como o Apollo é o número de pessoas que precisariam ter sido cooptadas para guardar tamanho segredo. Ao longo de dez anos, 400 mil pessoas trabalharam para colocar o homem na Lua. Conforme já afirmou diversas vezes o cientista americano James Longuski, ex-projetista da Nasa e atual professor da Universidade Purdue, nos Estados Unidos, seria mais fácil mandar de verdade seres humanos para a Lua do que combinar com tanta gente assim.

O veículo lunar foi usado em cada uma das últimas três missões Apollo-Foto: Divulgação/Nasa

No livro “A Caminho de Marte: A Incrível Jornada de Um Cientista Brasileiro Até a Nasa”, Ivair Gontijo conta que não são raras as vezes em que ele é interpelado por alguém que diz não acreditar nas viagens do homem à Lua.

“Até hoje muita gente me faz essa pergunta, se o homem foi mesmo à Lua ou não. É interessante notar que não é só no Brasil que tem gente que não acredita. Na Escócia e mesmo nos Estados Unidos também há pessoas que não acreditam. Acho que esse é um fenômeno mundial”, escreve Ivair Gontijo, em um capítulo do livro dedicado ao tema.

Em conversa com a reportagem, ele enfatizou que a melhor maneira de combater essa desinformação é, incansavelmente, insistindo em “informar a população”.

“Em geral, informações genuínas e independentes sobre o programa espacial não são muito acessíveis no Brasil por causa da barreira da língua”, afirma. “Até nos Estados Unidos, muita gente não sabe onde procurar e acaba descobrindo muitas teorias da conspiração sobre o assunto. Assim, em vez de diminuírem, as dúvidas às vezes aumentam. Há muita desinformação sobre esse tema nos meios de comunicação, em especial na internet.”

Argumentos

“Muitas pessoas pensam que o grande feito dos americanos seria algo inatingível com a tecnologia da época”, argumenta Gontijo, em seu livro. “Por isso elas têm dificuldades em acreditar que isso possa mesmo ter acontecido. Também é verdade que as pessoas podem mudar de opinião se os argumentos forem mesmo convincentes, mas sabemos também que ninguém convence ninguém. É preciso que cada um entenda primeiro os fatos e então tire as próprias conclusões.”

O astronauta Edgar D. Mitchell foi o piloto do módulo lunar para a missão Apollo 14-Foto: Divulgação/Nasa

Para o brasileiro, a melhor maneira de enfrentar essa desinformação é começar tentando entender em qual parte da conquista espacial o interlocutor não acredita.

O primeiro ponto: a descrença é só do lado americano ou também significa rebater que soviéticos lançaram foguetes? Pois se o ceticismo é geral, vale lembrar a história do satélite Sputnik, colocado em órbita em outubro de 1957. Em um “golpe de mestre”, expressão cravada por Gontijo, os cientistas russos o lançaram equipado com um transmissor e quatro antenas, conjunto esse capaz de emitir um pequeno sinal de bipe nas frequências de 20 e 40 MHz.

A ideia era que a façanha pudesse ser comprovada de forma independente. “Quando ele passava sobre uma parte da Terra, radioamadores que estavam lá embaixo podiam sintonizar seus rádios em uma das frequências do Sputnik e captar o sinalzinho: o pequeno bipe que significava muito e que durou 22 dias, até que suas baterias se descarregaram”, pontua o brasileiro.

O passo seguinte seria acreditar ou não que um ser humano orbitou o planeta. No caso, o cosmonauta soviético Iuri Gagarin (1934-1968), que viu a Terra azul a bordo da Vostok em 12 de abril de 1961. Em 108 minutos, ele deu uma volta completa. “Imagino que a vasta maioria das pessoas concorde que esses fatos são verídicos e que tanto Gagarin quanto seus colegas cosmonautas realmente foram ao espaço e entraram em órbita em torno da Terra”, afirma. “Em pouquíssimo tempo, os foguetes foram aprimorados, alcançando órbitas circulares e de maior latitude, de forma que os cosmonautas que vieram depois de Gagarin puderam dar muitas voltas em torno do planeta Terra.”

O astronauta Buzz Aldrin foi o segundo homem a pisar na Lua — Foto: Divulgação/Nasa

Nos Estados Unidos, os cientistas da Nasa estavam um pouco atrás dos russos na corrida espacial. No dia 5 de maio de 1961, Alan Shepard (1923-1998) se tornaria o primeiro americano no espaço, ainda em um voo suborbital de 15 minutos. Em 20 de fevereiro de 1962, John Glenn (1921-2016) se tornou o primeiro astronauta americano em órbita: três voltas ao redor da Terra, em 4h55 de voo.

“Você acha que tanto os russos quanto os americanos foram capazes de enganar o mundo inteiro e que nenhum desses voos aconteceu? Seria possível convencer os milhares de engenheiros e técnicos trabalhando nos programas espaciais tanto na União Soviética quanto nos Estados Unidos a montar um esquema para iludir o mundo sem que ninguém denunciasse isso?”, provoca Gontijo.

“Imagino que você vá concordar comigo que é mais fácil eles terem mesmo feito esses voos do que conseguiremos manter um segredo entre dezenas de milhares de pessoas.”

O cientista brasileiro enfatiza ainda o desenvolvimento técnico necessário para o passo seguinte, em 1963: a verdadeira dança espacial protagonizada pelas naves Vostok 5 e Vostok 6, respectivamente com os cosmonautas Valery Bykovsky (1934-2019) e Valentina Tereshkova (1937- ) a bordo. Elas chegaram a ficar a apenas 5 quilômetros de distância, em órbita, e, pela primeira vez, houve uma comunicação entre duas espaçonaves, diretamente e por rádio, sem nenhuma intermediação da Terra.

Os avanços seguiam a passos largos. Dois anos mais tarde, o russo Alexey Leonov (1934- ) protagonizaria a primeira atividade extraveicular da história espacial. E neste episódio, é possível citar ainda a falibilidade humana como um argumento contra as conspirações – afinal, se as coisas fossem inventadas, acidentes não ocorreriam, certo?

Pois no vácuo espacial, a roupa de Leonov inchou mais do que o esperado – dentro da vestimenta, a pressão precisava ser igual à atmosférica terrestre. Quando precisava voltar para a cápsula, um susto: daquele jeito ele não passava mais pela entrada. Ficou entalado. No sufoco, ele conseguiu “murchar” um pouco de sua roupa, o suficiente para voltar para a nave.

“Não faz sentido achar que tudo isso foi uma enganação e que nenhuma dessas façanhas foi realizada. Seria simplesmente impossível manter um segredo assim e convencer milhares de pessoas envolvidas a mentir”, reforça Gontijo. “Além disso, os bipes do Sputnik foram capitados por radioamadores no mundo inteiro, provando que aquilo era real. Existem também muitas filmagens de foguetes decolando e alguns explodindo. Se você pode se convencer de que tudo isso aconteceu mesmo, o resto – a descida na Lua, por exemplo – é uma série de desdobramentos quase inevitáveis.”

Evidências comprovadas em outras missões

Há ainda o fato de que missões espaciais encontraram resquícios de missões anteriores – e os registraram. Quatro meses depois da Apollo 11, a Apollo 12 alunissou a 50 metros de distância da Surveyor 3, sonda não-tripulada lançada em 1967. Os astronautas recolheram a câmera e a pá de coleta de solo do equipamento desativado e as trouxeram de volta para a Terra – estão expostas no Museu Aeroespacial de Washington.

Fonte: BBC

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