Zeitgeist: para entender Marina Silva – por Leão Serva

Marina Silva
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Zeitgeist. Anote essa palavra alemã. Ela vai ser usada nas próximas semanas para explicar o crescimento de Marina Silva na corrida eleitoral, como serviu para entender a vitória de Lula 12 anos antes.


Zeit quer dizer tempo; Geist, espírito. Zeit + Geist = espírito do tempo, o sentimento dominante, clima intelectual, moral e cultural de uma época. A expressão se tornou um conceito de psicologia social e filosofia; é usada literalmente em outras línguas.

Muitos analistas dizem que Marina encarna o zeitgeist atual. Se for verdade, nada vai dobrá-la: marqueteiros, tempo de TV, discursos políticos, denúncias, ataques, afagos…

Além de explicar movimentos políticos e manifestações de psicologia coletiva, zeitgeist também é usado para expressar fenômenos culturais arrebatadores. A bossa nova refletiu o espírito brasileiro no fim dos anos 1950; os Beatles encarnaram o sentimento coletivo inglês, e depois do mundo todo, nos anos 1960; o movimento contra a guerra do Vietnã dominou o início dos anos 1970.

O zeitgeist americano, na política, foi encarnado por Ronald Reagan, ao vencer a eleição de 1980; depois, esmagou seu adversário em 1984 e fez o sucessor (George Bush, pai), em 1988. Mas o sentimento virou, subitamente, 12 anos depois. Aparentemente imbatível em 1991, Bush perdeu a eleição de 1992 para um improvável Bill Clinton (que ganhou a candidatura porque nenhum cacique democrata quis concorrer, temendo perder).

O zeitgeist opera como uma onda que empurra tudo que se coloca em seu caminho: quem estiver a favor, surfa sobre sua crista; quem for contra, é levado de roldão ou se afoga.

Um tsunami pegou o tucano José Serra em 2002. Lula sintonizou o sentimento daquele momento da vida brasileira, talvez da América Latina e até de uma boa parte do mundo, como Barack Obama reconheceu em 2009. Os primeiros sinais daquela onda se manifestaram nos grandes protestos contra a globalização em vários países, a partir de 1999.

A esta altura, não importa muito detectar quando surgiu a atual onda. O certo é que, em 2013, diante dos protestos de junho, houve um consenso de que Marina tinha maior sintonia com as ruas. Os governistas tudo fizeram para inviabilizar a criação do partido #Rede e impedir sua candidatura presidencial. Talvez já antevissem que ela encarnava o zeitgeist melhor do que qualquer outro candidato –inclusive Aécio Neves.

A queda do tucano não quer dizer, necessariamente, que ele não previsse os ventos contrários. Talvez não soubesse como eram fortes. Mas o que deve fazer um político quando sente que a onda está contra? Pode não se candidatar, mas corre o risco de perder a chance de uma virada, como aconteceu com os democratas que deixaram a Bill Clinton a legenda de 1992. Ou pode concorrer, como fez o ex-presidente americano: se a onda virar, ele ganha; se não virar, ao menos passa a ser uma referência na oposição.

Foi o que ocorreu com Marina, em 2010. E, como seu partido é pequeno, se vencer agora, precisará dialogar com Aécio para ter seu apoio no segundo turno e para governar.

*Este texto, com ligeiras alterações, foi publicado em 24/10/2002, tendo Lula como personagem.

Leão Serva é ex-secretário da redação da Folha de SP,
é jornalista e escritor.

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