Chefe ou cuidadora? A sobrecarga emocional das líderes nas empresas – por Luanna Cunha

Luanna Cunha é Psicóloga Clínica e Organizacional - Foto: Divulgação

Ela lidera com empatia, escuta sua equipe, acolhe os conflitos e faz questão de manter um ambiente respeitoso. Mas, quando o dia acaba, sente-se emocionalmente drenada. E talvez nem saiba por quê.


Muitas mulheres que ocupam cargos de liderança não adoecem pela pressão dos resultados — mas pela pressão de cuidar emocionalmente de todos. Tornam-se “gestoras do clima”, “equilibradoras de humor” e “mães afetivas” do time, acumulando um trabalho invisível que raramente é reconhecido: o trabalho emocional organizacional.

A líder que escuta tudo — e carrega sozinha

A literatura em psicologia organizacional já nomeia esse fenômeno. Segundo Arlie Hochschild, pesquisadora referência em emotional labor, existe um custo psíquico alto para profissionais que precisam constantemente gerenciar emoções — próprias e alheias — sem suporte institucional.

No caso das mulheres líderes, esse custo se intensifica. Elas são historicamente associadas a papéis de cuidado, e essa expectativa transborda para os cargos de chefia. Em vez de serem vistas apenas como gestoras estratégicas, são percebidas como “mães emocionais” da equipe.

“As pessoas me procuram até quando brigam com o cônjuge. Eu sou líder ou terapeuta da empresa?”

— Trecho de relato de uma cliente em mentoria de liderança.

O impacto neuroemocional do cuidado sem pausa

A neurociência mostra que a escuta ativa prolongada — sem contrapartida de escuta ou apoio — ativa as áreas cerebrais ligadas ao estresse empático. É o chamado compaixão fatigue, ou “fadiga da compaixão”: quando o ato de acolher o outro começa a gerar sofrimento psíquico.

Além disso, a ativação constante do sistema de alerta (amígdala cerebral) leva à liberação crônica de cortisol, dificultando a tomada de decisão, o sono reparador e a regulação emocional.

Quando o cuidado é esperado, mas não cuidado

O ambiente corporativo ainda celebra a “líder que resolve tudo”. Mas raramente protege essa profissional. Falta rede de apoio, espaço de escuta entre pares e políticas que cuidem também de quem cuida da cultura.

Além disso, muitas líderes mulheres enfrentam o dilema de “precisar ser duras para serem levadas a sério”, ao mesmo tempo em que são cobradas por não serem suficientemente sensíveis. Uma armadilha emocional constante.

Como proteger líderes do esgotamento invisível?

1 Reconhecer o trabalho emocional como parte da carga de trabalho

Gerenciar pessoas não é apenas operacional ou estratégico — é emocional. E isso deve ser contabilizado, cuidado e supervisionado.

2 Criar redes de apoio entre líderes

Espaços seguros para compartilhar dores de gestão são essenciais para prevenir o isolamento e a sobrecarga silenciosa.

3 Quebrar a lógica da “líder cuidadora perfeita”

É necessário humanizar as expectativas. Líderes também têm limites, emoções e não precisam dar conta de tudo sozinhas.

Liderar não é maternidade corporativa

Cuidar da equipe é importante. Mas não pode ser um fardo solitário. A liderança feminina não pode ser reduzida à função de “emocional da empresa”.

Quando cuidamos de quem lidera, fortalecemos a base de toda a organização. Porque uma líder saudável emocionalmente é aquela que não apenas entrega resultados — mas que permanece inteira no processo.

Luanna Cunha é Psicóloga Clínica e Organizacional

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