A Música do Sopro Civilizatório – Por: José Ribamar Mitoso

(Josephina Carneiro e o encontro das civilizações das Flautas.
(Josephina Carneiro e o encontro das civilizações das Flautas.

Não sei com os brasileiros, mas com americanos e japoneses a musica e o riso podem ser mais importantes para a pressão arterial que perder cinco quilos ou cortar o sal. Isto segundo pesquisas nos EUA e no Japão.
Há definitivamente um efeito fisiológico acontecendo, disse o pesquisador americano Michael Miller. Há algum tipo de conexão entre a mente e o coração ao se ouvir uma boa música, concluiu o cientista. Embora significativa esta descoberta não nos causa nenhuma inveja.


Como sempre, muito antes da ciência da civilização urbano-industrial descobrir qualquer coisa, a arte das civilizações mítico-florestais já sentiu esta “qualquer coisa “muito antes. Esta descoberta do cientista americano, por exemplo. Muito antes da ciência dele descobrir a relação micro entre a música e o ser humano, entre o som e a fisiologia da conexão razão-emoção, os povos indígenas do Rio Negro já haviam descoberto uma conexão muito maior, já haviam descoberto uma relação macro entre a música e o universo, entre a emoção do sopro interior e a razão universal da existência exterior, entre a música e a moradia da ancestralidade clânica.

Musicalidade dos povos do Alto Rio Negro.
Musicalidade dos povos do Alto Rio Negro.

A música das festas cerimoniais dos povos do Rio Negro antecipou no tempo a descoberta da ciência industrial americana. Esta música sempre conectou razão e emoção e sempre subverteu o conceito ocidental de musicalidade: música não é apenas para ser escutada, mas para conectar o músico e seu povo com as constelações, moradia da ancestralidade de seu clã. Cada nota uma estrela de uma constelação. Cada melodia uma conexão da emoção com a razão universal.

O Rio Negro e o Rio Solimões, no Amazonas, formam uma civilização dos instrumentos de sopro. O Iburi, dos Ticuna (s), no Rio Solimões, faz a conexão astral do som da flauta transversal com o universo astral da ancestralidade mítica descendente de Nutapa, Joy e I`pi. No Rio Negro, a flauta Japurutu, dos Tucano(s), e a flauta de Caliço, dos arawak (s, também. Miriá-Mahsé foi o primeiro artista (bayaroá) da civilização do Rio Negro e era um flautista! Sua função era mítica e civilizatória.

A mesma função, em certo sentido, da flautista erudita-popular brasileira Josephina Carneiro, por exemplo. Josephina Carneiro é uma flautista brasileira que iniciou sua carreira artística em 1979, através do gênero choro, no grupo instrumental Língua de Preto.

Ainda neste mesmo ano, obteve o Prêmio Juarez Barroso, no Concurso de Grupos de Choro, promovido pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro. Estudou flauta transversal com o mestre Eugênio Martins (1º flautista do Teatro Municipal do Rio de Janeiro), com quem fez muitos shows, especialmente na FUNARTE e na sala Cecília Meirelles. Foi aluna na escola musical de vanguarda do mestre húngaro Ian Guest e ainda do mestre flautista Luis Cuevas. Josephina está no Amazonas, civilização musical indígena dos instrumentos de sopro. E ela trouxe consigo a tradição afro-européia da flauta transversal na musica popular brasileira, especialmente a tradição da flauta no choro e no samba.

Instrumental dos povos indígenas.
Instrumental dos povos indígenas.

Isto significa que duas tradições musicais civilizatórias podem se encontrar e reinventar a música instrumental popular brasileira a partir da fusão musical das flautas de bambu, taquara, cabaça, osso, paxiúba, argila, ferro… Flautas comuns e flautas nasais… Ocarinas…Flautas retas, flautas arredondadas… Flautas com duas ou mais cânulas… Flautas com dois ou mais ou até 25 tubos… Flautas conjugadas, duplas, tríplices… Flautas com diferentes timbres, como diz o mestre Ary Vasconcelos.

De qual modo, através da experimentação musical desta flautista brasileira, o Amazonas poderá presenciar o encontro de Miriá-Mashë, o primeiro flautista da civilização do Rio Negro, com o flautista negro Pixinguinha.

Poderá presenciar o encontro musical dos flautistas arawak de Jurupari com o flautista mulato Antônio Callado, ou com o flautista popular Altamiro Carrilho ou ainda com o flautista experimental Hermeto Pascoal.

A ciência ocidental de Americanos e Japoneses descobriu que a música pode ser mais importante para a pressão arterial que a perda de peso ou que uma comida sem sal.

Descobriram que a música gera uma reação fisiológica que une razão e emoção para curar a circulação sanguínea.

Nós, Amazônicos, há muito tempo nos curamos com a arte, com o universo e com as forças cósmicas dos ancestrais acessados. Não somos precisos, mas somos mágicos!

* José Ribamar Mitoso é: Escritor, Dramaturgo e Professor da UFAM

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