As interpretações do voto – por Flávio Lauria

Flávio Lauria é Administrador de Empresas e Professor Universitário

O objetivo deste artigo é o de apresentar, brevemente, duas interpretações sobre o papel do voto numa democracia. O voto não equivale à democracia. Somente quando o voto facilita as escolhas dos indivíduos é democrático. O voto é uma condição necessária para a democracia, mas não é suficiente. Para torná-la equivalente, a votação deve estar associada a outras instituições, tais como partidos políticos, liberdade de imprensa e expressão e a justiça eleitoral, as quais organizarão a votação em escolhas sociais.


Na visão liberal do voto (madisoniana), a sua função é simplesmente a de controlar os executivos que estão no poder, e nada mais do que isto. Para James Madison, o perigo da liberdade está em que os burocratas governamentais possam reduzir a liberdade dos cidadãos e reduzir a participação dos agentes. Em ambos os casos, o remédio liberal é a próxima eleição. Isto é tudo o que é requerido para proteger a liberdade: uma eleição e um mandato limitado. A troca de governantes é, na visão liberal, o único instrumento disponível para proteger a liberdade dos indivíduos. Na visão liberal, o voto é então um método de controlar os governantes, sujeitando-os a eleições periódicas com um mandato fixo.

Devemos destacar, também, que na visão liberal não é assumido que o eleitorado está certo. Este é um pressuposto que caracteriza o populismo. O liberal não assume a competência popular, mas somente que o eleitorado pode mudar os governantes se os indivíduos não estão satisfeitos ou esperam um melhor desempenho. Para os liberais, o voto gera liberdade devido ao fato de que restringe os governantes pela eleição e pelo mandato limitado e não há necessidade de se vangloriar o produto do governo como um bem precioso para a liberdade. Já para os populistas (rousseaunianos), a liberdade e, portanto, o autocontrole através da participação é obtidos pela incorporação da “vontade das pessoas” nas ações do governante. Para estes, a liberdade individual é a participação dos cidadãos no Estado.

Para os populistas, a participação na elaboração das regras é uma condição necessária para a liberdade. Para eles, a votação gera liberdade pela participação. O produto do governo deve ser precioso, pois este produto é a liberdade. Na interpretação populista do voto, a opinião da maioria deve ser correta e deve ser respeitada porque a vontade das pessoas é a liberdade das pessoas. Já para o liberal, não há esta identificação mágica. O resultado de uma votação é somente uma decisão e não tem nenhum caráter moral especial. O ponto importante a destacar nestas duas concepções é que os populistas podem justificar moralmente a tirania, supondo que incorporaram a vontade popular, e podem justificar sob este resultado um controle social, tal como os ditadores socialistas. Contudo, acreditamos que os valores liberais com relação ao voto numa democracia, como defendidos por Madison, são os que garantam a liberdade para os indivíduos, para que eles próprios busquem sua felicidade e não estejam sujeitos à “vontade do povo” e nem seja imposto um “controle social” sobre os meios para buscá-la.

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