Dar, receber e retribuir – por Carlos Santiago

Carlos Santiago é Sociólogo, analista político e advogado.

Dezembro chegou. É o mês das confraternizações de amigo (a)s, das trocas de presentes, dos presépios religiosos, das celebrações natalinas e das reuniões de família. É o momento em que o dar, o receber e o retribuir são mais intensos.
Segundo sociólogo Francês Marcel Mauss, o dar, o receber e o retribuir constam em todas as sociedades humanas, independentemente de as mesmas serem denominadas de modernas ou tradicionais, criando relações sociais permanentes e contribuindo com a organização social dos povos.


Então, não adianta ganhar comendas valiosas, bombons finos, taça de açaí, vídeos fantásticos, camisas bonitas, perfumes raros, votos de eleitores, além de sorrisos, abraços e belas palavras, se não houver gratidão e retribuição.

Os presentes e os gestos como o sorriso carregam também sentimentos de gratidão, formam laços sociais e nos movem a retribuir. Se não for para criar laços sociais, as trocas de presentes e as palavras não têm sentido. É assim que muitas sociedades há séculos, estabelecem a vida social: com tolerância e paz.

No entanto, muitas das vezes, os presentes e palavras também são usados como meios de opressão ou cometimentos de indelicadezas contra o outro, em especial, quando o presente, as palavras e os sorrisos ganham um tom de superioridade, sem a retribuição ética devida, redundando em conflitos de relacionamentos e desesperanças.

Na política, a falta de retribuição devida acontece quando o eleitor deposita seu voto de confiança numa urna. E recebe de volta um comportamento não ético e bastante corrupto da classe política, como ocorre no Brasil. Assim, também, quando o contribuinte paga o imposto ao governo e não recebe os serviços públicos adequados.

Carlos Santiago é Sociólogo, analista político e advogado.

No Brasil, o dar, o receber e o retribuir ainda são atitudes escassas. Há muita pobreza material, há enorme concentração de poder e renda, há um crescente fanatismo religioso, há atos de racismo, há crises de representação, há muita violência contra mulheres, há sofrimento de povos indígenas, há política sem qualidade e muita intolerância.

O homem necessita para sobreviver de água, de comida, de uma moradia e de viver coletivamente, acumular conhecimentos e evoluir como ser humano, mas se não existir gratidão e retribuição jamais chegará a essa condição.

A vida é a mais bela poesia e uma mistura perfeita da natureza com a bondade de Deus. Mas a luta pelo poder e a intolerância impedem sua plena realização. A vida humana é feita de três partes: o dar, o receber e o retribuir. Elas são partes de um todo que representa a verdade da vida e a lembrança de que somos todos humanos e descendentes de um só Deus.

Como diz o poeta Carlos Drummond de Andrade: “a porta da verdade estava aberta, mas só deixava passar meia pessoa de cada vez. Assim não era possível atingir toda a verdade, porque a meia pessoa que entrava só trazia o perfil de meia verdade. E sua segunda metade voltava igualmente com meio perfil. E os dois meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta. Chegaram a um lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos. Era dividida em duas metades, diferente uma da outra. Chegou-se a discutir qual a metade mais bela. As duas eram totalmente belas. Mas carecia optar. Cada um optou, conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.”

Penso que entre o dar, o receber e o retribuir não cabe opção. Trata-se de um único mandamento. Um trinômio que faz a vida leve e essencialmente bela.

Carlos Santiago é sociólogo, analista político e advogado.

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