A homologação de Terras Indígenas no Brasil garante oficialmente aos povos originários o direito sobre seus territórios, mas a proteção e o uso sustentável dessas áreas são desafios contínuos. Para enfrentar essas questões, as comunidades indígenas elaboram Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs), que integram o conhecimento tradicional com novas estratégias para conservar a floresta e garantir um futuro sustentável. Este é um instrumento de gestão que faz parte da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas – PNGATI.
Os PGTAs são elaborados pelas próprias comunidades indígenas para garantir que o território seja gerido de maneira eficiente, conservando suas tradições e recursos naturais. “É um instrumento que direciona a gestão das Terras Indígenas, estabelecendo como os povos querem que seus territórios sejam geridos. Ele reflete não apenas as necessidades práticas de proteção e geração de renda, mas também o desejo de valorizar suas tradições culturais e inovar para o futuro”, explica Neluce Soares, coordenadora do LIRA/IPÊ – Legado Integrado da Região Amazônica, do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas.
A importância da participação coletiva
A elaboração dos PGTAs envolve parcerias estratégicas que capacitam as comunidades indígenas a gerirem seus territórios de forma autônoma. Em parceria com o IEB (Instituto Internacional de Educação do Brasil) e com apoio da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional) e do LIRA/IPÊ (composto pelo Fundo Amazônia e Fundação Moore), o PGTA da Tenharim Marmelos foi realizado de maneira participativa e envolveu diferentes atores elencados pela APITEM e pelo conselho de caciques Tenharim, sobretudo 10 Agentes Ambientais Indígenas (AAI).
Para Daiane Tenharim, coordenadora da Associação do Povo Indígena Tenharim Morõgitá (APITEM), foi de enorme importância a participação coletiva na elaboração do PGTA. “Nosso PGTA é o resultado de várias oficinas e conversas, onde discutimos em nossa língua materna e assimilamos o que esse documento significa para o nosso futuro. A colaboração de professores, agentes de saúde, caciques, anciãos, jovens e mulheres foi fundamental para garantir que o documento representasse a voz de toda a comunidade”, diz.
Parcerias estratégicas
O LIRA/IPÊ apoiou financeiramente a execução dessas iniciativas, promovendo a proteção territorial e fortalecendo as associações indígenas locais. As excursões territoriais, facilitadas pelo IEB, através do projeto Liga da Floresta, incluíram visitas a áreas sagradas e o mapeamento de fronteiras, reforçando a vigilância e promovendo trocas de conhecimento entre as aldeias. “A parceria possibilitou o financiamento destas iniciativas, com protagonismo às associações indígenas para a construção de suas estratégias próprias de elaboração e execução de seus planos de gestão. Além disso, permitiu intercâmbio entre demais atores que compõem a rede LIRA, melhorando a capacidade de trocas de conhecimentos e experiências institucionais”, afirma Fabiana Prado, gerente do LIRA/IPÊ.
O IEB forneceu o apoio técnico e metodológico, além da formação dos Agentes Ambientais Indígenas. “Capacitamos os AAI para o uso de tecnologias de levantamento de dados geográficos, socioeconômicos e culturais. Eles realizaram uma profunda pesquisa sobre o povo e o território, o que embasou as comunidades para a construção de seus acordos internos e demandas futuras”, afirma Marina Villarinho, consultora do IEB. Essa integração de conhecimento tradicional com dados concretos fortaleceu a base para a gestão sustentável dos territórios.
Outro PGTA, elaborado para a Terra Indígena Menkragnoti pelo Instituto Kabu, através do projeto Gestão Sustentável, apoiado pelo LIRA/IPÊ, também reflete essa busca por proteção e sustentabilidade. Segundo Bepdjyre Txucarramae, do povo Kayapó e do Instituto Kabu, o PGTA ajuda a garantir que os territórios sejam respeitados e que a comunidade possa continuar cuidando da floresta. “Ele nos dá o poder de decidir como proteger nossa terra, o que é muito importante para nós e para as futuras gerações”, diz. “O PGTA nos dá clareza sobre a importância do nosso território e nos mostra como devemos geri-lo, cuidando e utilizando de forma que garanta a sobrevivência das próximas gerações”, afirma Daiane.
Implementação e próximos passos
Embora a elaboração de um PGTA seja um marco importante, a implementação é fundamental para garantir que as diretrizes sejam seguidas. “O PGTA é um documento do povo e um passo importante a ser dado, mas ele precisa ser implementado.”, diz Neluce Soares. “Queremos garantir que o PGTA traga benefícios concretos para o nosso povo, tanto na proteção do território quanto no desenvolvimento sustentável. Estamos buscando parcerias e recursos para transformar as ações descritas no plano em realidade”, diz Daiane.
A capacitação das associações indígenas, como a APITEM e a OPIAJBAM, fortalece a autonomia das comunidades, permitindo que elas ocupem espaços de diálogo com governos e instituições e garantam que seus direitos sejam respeitados. “Os PGTAs são mais do que documentos de gestão, são instrumentos que refletem a autodeterminação das comunidades indígenas. Eles unem o conhecimento ancestral com novas tecnologias e práticas sustentáveis”, diz Neluce. Com o apoio do Fundo LIRA, e sua rede de parceiros e a colaboração de associações indígenas, os PGTAs têm o potencial de garantir a proteção das Terras Indígenas e o bem-estar de suas comunidades para as próximas gerações.