‘Liga da Justiça’ criada por procuradores é uma ameaça à democracia – por Jefferson Miola

Foto: Divulgação

Na segunda quinzena deste mês de novembro, estreou no Brasil o filme norte-americano Liga da Justiça, que lidera a venda de ingressos. Em menos de 15 dias, arrecadou mais de R$ 80 milhões.


A sinopse oficial do filme explora a épica do heroísmo:

“Impulsionado pela restauração de sua fé na humanidade e inspirado pelo ato altruísta do Superman, Bruce Wayne [Batman] convoca sua nova aliada Diana Prince [Mulher-Maravilha] para o combate contra um inimigo ainda maior, recém-despertado. Juntos, Batman e Mulher-Maravilha buscam e recrutam com agilidade um time de meta-humanos, mas mesmo com a formação da liga de heróis sem precedentes – Batman, Mulher-Maraviha, Aquaman, Cyborg e The Flash –, poderá ser tarde demais para salvar o planeta de um catastrófico ataque”.

Como uma metáfora perfeita do heroísmo ficcional do filme, os procuradores que integram a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo promoveram um encontro no Rio de Janeiro na segunda-feira, 27/11, e fundaram a sua própria Liga da Justiça; espécie de cruzada heróica e salvacionista que planeja interferir na eleição de 2018 para “salvar o país da ameaça da corrupção”.

Ao final do encontro, divulgaram o que pode ser considerado o documento fundacional da Liga da Justiça – a Carta do Rio de Janeiro – e fizeram declarações no mínimo temerárias, que seriam impensáveis se o Brasil não estivesse sob controle de golpistas e na vigência do regime de exceção.

Deltan Dallagnol, o procurador cada vez mais assemelhado a um pregador religioso fanático, foi o porta-voz da Liga na coletiva à imprensa. Com a grandiloqüência de sempre, asseverou que “2018 é a batalha final da Lava Jato, porque vai determinar o futuro da luta da corrupção”.

Deltan vaticina que “As eleições de 2018 determinarão o futuro da luta contra a corrupção do nosso país.
Deputados federais e senadores que determinarão se existirão ou não retrocessos na luta contra a corrupção e se existirão reformas e avanços que possam nos trazer um país mais justo com índices efetivamente menores de corrupção e de impunidade”.

Na visão dele, “É crucial que em 2018 cada eleitor escolha cuidadosamente, dentre os diversos setores de nossa sociedade, apenas deputados e senadores com passado limpo”.

Foto: Divulgação

Para os integrantes da Liga da Justiça, “O futuro da Lava Jato será sombrio, se não elegermos um outro Congresso” [sic].

Este pensamento revela a índole antidemocrática e autoritária dos procuradores, e constitui clara ameaça à democracia e ao Estado de Direito. Jamais uma autoridade judicial investida em funções públicas poderia se pronunciar sobre assuntos da política; menos ainda com tal tom ameaçador.

Este ativismo inconseqüente é nova tentativa dos justiceiros da Lava Jato recuperarem simpatia pública no momento em que a Operação perdeu a credibilidade e aquele glamour inicial, devido aos arbítrios e atropelos perpetrados.

Seria importante esclarecer, ainda, se as despesas – passagens aéreas, diárias e convescote – deste encontro privado de justiceiros foram custeadas pelo orçamento público do MPF. Seria um abuso e uma ilegalidade, porém em nada diferente do abuso e da ilegalidade destes que se auto-proclamam vestais da moralidade e do combate à corrupção e que, corrompidos pelo fetiche do dinheiro, recebem salários nababescos, acima do limite fixado pela Constituição.

É urgente apor-se freios e barreiras a estes pseudo-heróis, que operam suas fantasias e seus arbítrios à margem da Constituição e do Estado de Direito. Parodiando o filme: é necessário agir antes que seja tarde demais a possibilidade de se salvar o Brasil do “catastrófico ataque” destes justiceiros cínicos, que instrumentalizam o combate à corrupção para a estratégia de construção de um poder corporativo.

* Jefferson Miola é integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea) e foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial.

Fonte: CNMCUT

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