Manoel de Barros, o Escovador de Palavras – por Isabela Abes Casaca

Manoel-de-Barros-300x261Neste domingo de lua minguante rendo minhas homenagens ao poeta Manoel de Barros, que se fez passarinho e foi fazer ninho em outras nuvens.


Como todo bom poeta foi agraciado com o dom de nos provocar a identificação com seus escritos pessoais e autobiográficos.

O registro de Manoel “Menino” de Barros que mais me causou empatia é um trecho do livro Memórias Inventadas: a infância:

Eu tinha vontade de fazer como os dois homens que vi sentados na terra escovando osso. No começo achei que aqueles homens não batiam bem. Porque ficavam ali sentados na terra o dia inteiro escovando osso. Depois aprendi que aqueles homens eram arqueólogos. E que eles faziam o serviço de escovar osso por amor. E que eles queriam encontrar nos ossos vestígios de antigas civilizações que estariam enterrados por séculos naquele chão.

Logo pensei de escovar palavras. Porque eu havia lido em algum lugar que as palavras eram conchas de clamores antigos. Eu queria ir atrás dos clamores antigos que estariam guardados dentro das palavras. Eu já sabia também que as palavras possuem no corpo muitas oralidades remontadas e muitas significâncias remontadas. Eu queria então escovar as palavras para escutar o primeiro esgar de cada uma. Para escutar os primeiros sons, mesmo que ainda bígrafos.

Comecei a fazer isso sentado em minha escrivaninha. Passava horas inteiras, dias inteiros fechado no quarto, trancado, a escovar palavras. Logo a turma perguntou: o que eu fazia o dia inteiro trancado naquele quarto? Eu respondi a eles, meio entressonhado, que eu estava escovando palavras. Eles acharam que eu não batia bem. Então eu joguei a escova fora.

Escovar osso e pedra foi o primeiro ofício que desejei fazer na vida, desenterrar os vestígios dos grandes dinossauros ou desvendar as pistas de uma antiga civilização esquecida. Atualmente, depois de muito mais oxigênio respirado, dedico minha porção peixe de rio a escovação de palavras.

Um domingo de silêncio em memória de Manoel, o escovador de palavras…

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[author image=”http://oi59.tinypic.com/md2p28.jpg” ]Isabela Abes Casaca é graduanda em Direito e integrante do movimento Novo Ágora. Considera-se escritora amadora.[/author]

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