Nos segundos antes de morrer – por Carlos Santiago

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado

Sou existência. Tenho liberdade. Sou senhor do meu destino. Estou inquieto. Tenho medo e incerteza. A essência divina não existe. Trago uma solidão de espírito num mundo sem referências determinadas e eternas. Busco construir o meu ser. Saber o que fizemos de nós. Erramos sozinhos e acertamos sozinhos, mas os impactos de tudo cabem a todos. Sigo construindo e derrubando muros. Sigo vítima e algoz, explorador e explorado. Sou escolhas. Tenho milhares de escolhas. A miséria, as guerras e os abusos são do tamanho de nossas escolhas.


A minha existência precede a essência. Sou ser homem, um ser pensante, um ser livre e a vida será aquilo que vou definir. A vida é encanto. Uma mistura de ossos, carnes, nervos, sentimentos, culturas, tempos, mutações, mistérios, frustrações, esperanças e… Quando criança agimos e pensamos que a vida não tem limites, nossa vontade é soberana, mas logo as crenças e valores econômicos e político nos prendem.

Na vida adulta buscamos sempre conquistas, agimos para obter e desprezamos o ser. Na velhice as conquistas não são mais o centro de tudo e compreendemos os limites da vida, muitas vezes, fica o cultivo das frustrações ou realizações de sonhos… Então, para compreendermos a vida na sua essência, ela é a melhor conselheira, uma construção cheia de opções, embora muitos nunca percebam.

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado.

Na arrumação de documentos, papéis, fotos que narram um pouco da história de minha existência, ela pode ser dividida em duas partes (pra ser bem econômico): a maior parte da vida foi dedicada ao cumprimento de algumas regras sociais ditas “corretas” como estudar muitas horas, ganhar títulos acadêmicos, dormir e acordar cedo, trabalhar muito como se fosse missão de mundo, não fumar e nem ingerir bebida alcoólica, além de namorar pouco; a outra pequena parte, foi dedicada aos amores impossíveis, diversões culturais e a participação em movimentos sociais que lutavam por um mundo justo e fraterno. Essa parte da vida, saudades.

Numa pandemia mortal em que os bons fluidos e os absurdos da espécie humana estão expostos, deixar de pensar na vida e na morte é impossível. Lembranças e sentimentos povoam a minha mente.

Nos segundos antes de morrer, quero me lembrar dos momentos marcantes da vida. Vou me lembrar da imagem da minha mãe, acordando-me com músicas. Vou me lembrar dos beijos na testa recebidos da minha avó, e de suas sábias palavras. Lembrar-me-ei, também, das lágrimas de vitórias da nossa humilde família e das conversas com amigos.

Lembrar-me-ei do meu amor, minha esposa, do exato instante em que ela me pediu pra vivermos juntos. Não deixarei de pensar na moça que lia a Bíblia pra mim, nem no olhar apaixonado daquela jovem simples que me ofereceu o seu prato de comida. Do canto matinal do pássaro peito-roxo no açaizeiro de casa, eu me lembrarei. Os carinhos da cadela Minie vão estar na lembrança. Das flores que brotam das minhas plantas, não me esquecerei. O cheiro do meu primeiro livro e as manifestações pela democracia estarão presentes.

Partirei somente com as lembranças daquilo que me fizeram realmente feliz.

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado

 

Artigo anterior99 retoma campanha para incentivar doação de sangue em Manaus
Próximo artigoSommelier de vinhos: profissão ideal para quem entende e gosta de vinhos

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui