Sabedoria – por Flávio Lauria

Flávio Lauria é Administrador de Empresas e Professor Universitário

Curvado sob o peso dos muitos anos vividos, ele caminha lento, como quem não tem pressa de chegar aonde a vida o vai conduzindo. Quem por ele passa imagina que muita sabedoria ele conquistou em todo esse tempo vivido. Contudo, nos perguntamos se a sabedoria é atributo inequívoco dessa faixa etária, ou de um tempo de vida percorrido? Sem dúvida é desejável, e de certo modo esperado, que aquele que já viveu mais tempo, tenha feito uma elaboração suficiente das experiências e tenha conquistado alguma sabedoria. Mas, é importante lembrar que a longevidade não imprime sabedoria. Não a conquistamos porque temos 60, 70, 80, 90 anos de idade. Ela não é um dom, mas uma conquista. Neste sentido, podemos encontrar, tanto pessoas jovens sábias, como pessoas idosas que não chegaram a nenhum grau de sabedoria, e até nos perguntamos se algum dia chegarão a tê-lo.


Sabedoria supõe um processo de vida comprometido com a qualidade da vida interna que se desenvolve na pessoa, e que se reflete naturalmente no seu modo de ser e estar no Mundo.

Sabedoria não depende de sabermos muitas coisas, mas de vivermos com intensidade, pequenas e frequentes oportunidades a que a vida nos expõe, sem deixá-las passar em branco. É possível retirar desses momentos a lição e a cota de felicidade que eles escondem. Nos fragmentos do cotidiano podem estar contidos preciosos retalhos de vida, que não temos o direito de desperdiçar. A vida sim, é um Dom, e não temos o direito de deixá-la sem sentido. Grandes lições podem estar em pequenos gestos, pequenos acontecimentos, pequenas alegrias e sofrimentos. Nenhum ato é pequeno quando lhe damos sentido. Alegrias simples e profundas podem provir de gestos de solidariedade, de amabilidade, companheirismo ou apoio a alguém. Seremos tolos e destrutivos se apenas percebermos dores e desencantos semeados no cotidiano.

A sabedoria pode estar em se encontrar prazer nas coisas simples e gratuitas da natureza. Muita sabedoria pode ser encontrada no simples contemplar um por de sol. É um cenário que pode nos dizer muito sobre o nosso envelhecer. O entardecer da vida tem seus encantos, sim, mas só poderemos percebê-los se tivermos abertas as janelas da alma. As maravilhas do mundo e do viver serão inúteis, se não pudermos senti-las, contatá-las, amá-las. É sábio também compreender e amar a vida que existe no aqui e agora, no tempo em que se vive. Na verdade, a gente só pode ser feliz AGORA. Ontem se foi e amanhã é talvez. A chance de ser feliz é agora, ou nunca.

Nossa sociedade tem algumas manias de grandeza, postula grandes felicidades, sugere prazeres imensos, propõe uma juventude eterna, exige um corpo e performances impecáveis. São manias exigentes e alienantes que nos distanciam de nós mesmos esses deixam acompanhar de ilusões e frustrações. A felicidade, porém, é um sentimento simples que nasce de pequenas ocasiões, e é vivido no mais dentro da gente. Há múltiplos prazeres disseminados nas esquinas da vida, que nos ajudariam a sentir felicidade, mas se estamos engessados na ideia do grande prazer, deixamos de usufruir da festa simples da vida. Uma eterna juventude da alma (não do corpo), pode ser pensada, se nos mantivermos abertos para a vida, num contínuo intercâmbio, renovação e ressignificação de nossa presença no Mundo. Há uma certa experiência de vazio em nós que só se preenche com o sentido que damos à vida. Este sentido terá de ser dado aos pequenos fatos do cotidiano, e até mesmo ao sofrimento.

É sábio compreender que ele nos transforma, nos possibilita crescimento, beleza interna e maturidade. Melhor que banir o sofrimento, (que nem por isso se vai), seria acolhê-lo, crescer e aprender com ele. Isto seria sábio. Fica sempre uma pitada de tristeza no ar, quando falamos de entardecer. O por do sol tem cheiro de saudade, sim, mas é uma honra ter do que sentir saudade. Teríamos de ser capazes de “Contemplar o abismo sem ser destruído por ele” (R. Alves) ou “Conter a morte inteira, docemente, sem nos tornar amargos” (R. M. Rilke). Sabedoria pode ser, olhar o sofrimento sem nele se perder, encontrando as vias que ele guarda, de acesso ao crescimento.

 

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