Separando os Transgênicos dos Orgânicos

Não jogue fora as sementes guarde pra mim por favor,
Vou transformar as sementes numa semente de amor.
Eu quero ver se consigo fazer a transformação
Eu quero ver se consigo plantar amor pelo chão.
(Majó)


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Uma das parábolas mais conhecidas é aquela que narra a estória de um homem, que semeou boas sementes em seu campo, mas enquanto dormiam, uma outra pessoa veio e semeou joio no meio do trigo.

Quando as sementes germinaram, o homem percebeu o fato e decidiu deixar ambas crescerem juntas até o dia da ceifa. Chegado o momento da colheita, ele separou os frutos das más sementes e o das boas.

Independente do sentido religioso, não pude deixar de notar certa semelhança com nosso contexto atual, utilizarei esta metáfora pelo seu poder explicativo e não no sentido de crença. Se a Parábola do Joio e do Trigo fosse contada nos dias atuais, provavelmente falaria de separar os transgênicos dos orgânicos.

Cada vez mais cresce, entre os consumidores, a preocupação por evitar o consumo de produtos cuja origem provenha de organismos geneticamente modificados (OGM). A rejeição mundial é ascendente, mais e mais nacionalidades refutam o cultivo e comercialização de produtos daquela natureza.

O exemplo mais recente e visível é a Europa. No começo desse ano, o Conselho da União Européia autorizou uma nova legislação, que permite aos países comunitários restringir ou proibir os cultivos que contenham OGM, em seus próprios territórios.

Uma das ferramentas que facilita uma decisão consciente, é o selo que tacha categoricamente produtos com matéria prima transgênica. 28 (vinte e oito) países adotam tal rotulação, como Japão, Austrália, Rússia, China e países da União Europeia.

selo-transgenicosNa contramão deste movimento, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 4148/08, de autoria do deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS), que extingue a exigência do símbolo da transgenia, nos rótulos dos produtos com organismos geneticamente modificados.

Heinze afirmou que a mudança do projeto não omite a informação sobre a existência de produtos transgênicos. “Acho que o Brasil pode adotar a legislação como outros países do mundo. O transgênico é um produto seguro”, afirmou.

A fala do deputado federal está alinhada com o discurso de Peter Brabeck-Letmathe, que apresentei anteriormente no texto A Gota D’Água, veja a parte da declaração concernente ao tema agora proposto:

O homem agora está numa posição de poder trazer algum equilíbrio à natureza, mas, em vez disso, temos algo parecido com uma “moderação” dizendo que tudo que vem da natureza é bom. Um bom exemplo é o movimento orgânico: orgânico, agora, é o melhor possível. Mas orgânico não é o melhor, após 15 anos comendo produtos geneticamente modificados, nos EUA, não ocorreu um único caso de doenças causadas por estes produtos, até hoje. Apesar disso, as pessoas estão tão preocupadas sobre isso, na Europa, que algo aconteça com elas. É mais hipocrisia, que qualquer outra coisa.

É extremamente leviano dizer que produtos transgênicos são seguros, ainda mais se baseado apenas numa observação rápida e desatenta. O cientista brasileiro José Ozinaldo Alves de Sena, coordenador do Núcleo de Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável da Universidade Estadual de Maringá, declarou que as sementes modificadas causam doenças graves ao ser humano:

As consequências são muitas e estão bem comprovadas cientificamente. É claro que os prejuízos não surgem de repente, sempre a curto prazo. Tecnologias desse tipo têm impacto a curto, médio e, principalmente, a longo prazo. Quanto às doenças ao homem, já sabemos que os transgênicos geram alergias, esterilidade, alteração na formação de órgãos, doenças hematológicas e cânceres, por exemplo.“[1]

Por sua vez, Stephanie Seneff, bióloga e PhD do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, afirmou que o uso excessivo de glifosato em nossa alimentação está causando doenças como alzheimer, autismo, câncer, doenças cardiovasculares, deficiências da nutrição, entre outros. A pesquisadora estudou tais patologias por mais de três décadas, tendo publicado mais de 170 (cento e setenta) artigos acadêmicos. Ela aponta os transgênicos como um dos principais contribuintes para doenças neurológicas em crianças.

article_imageO alerta feito por Seneff é preocupante: “Na taxa de hoje, em 2025, uma em cada duas crianças estarão autistas.“[2]

Para quem não conhecem, o glifosato é uma substância química presente no herbicída Roundup e também nas sementes transgênicas Roundup Ready, ambos fabricados pela companhia Monsanto, multinacional notória pela agricultura OGM.

Diante dos relatos é fácil perceber que os transgênicos não são tão inofensivos quanto algumas vozes querem fazer crer. Estas mesmas pessoas ainda usam o argumento de que, os transgênicos tem o potencial de erradicar a fome no mundo. Será que isto é realmente verdade?

Vandana Shiva, um dos nomes mais relevantes na oposição contra os OGM, afirmou em entrevista, quando esteve no Brasil, em 2013:

O único modo de alimentar o mundo é livrando-se das sementes transgênicas. Essas sementes não produzem alimentos, mas produtos industrializados. Como isso poderia ser a solução para fome? Só estão criando mais controle sobre as sementes. (…) As pequenas fazendas produzem 80% dos alimentos comidos no mundo. As indústrias produzem commodities. Apenas 10% dos grãos de milho e soja são comidos por pessoas; o resto é ‘comido’ pelos carros, como biocombustíveis, e por animais. É possível elevar esses 80% para 100% protegendo a biodiversidade, a terra, os fazendeiros e a saúde pública. É apenas por meio da agroecologia que a produtividade agrícola pode aumentar.“[3]

Um fato que confirma a afirmação de Vandana é o exemplo de uma família norte-americana, que produz 3 (três) toneladas de alimentos orgânicos no próprio quintal. 90% da alimentação por eles consumida vem de sua própria produção, o excedente é comercializado para a comunidade local. O nome deste projeto é Urban Homestead.[4]

GMO OMGOutro dado deveras interessante está no documentário GMO OMG, um dos entrevistados declara que o cultivo de orgânicos é menos suscetível a pragas se feito com proficiência.

Um artigo científico publicado na revista Nature, reforça tal tese, mostrando um estudo em que plantações orgânicas tem melhor controle de pragas, por serem ambientes mais equilibrados, promovendo comunidades de inimigos naturais para os insetos indesejáveis.[5]

O documentário em questão, mostra que as culturas agrícolas de transgênicos não estão livres das pragas, conforme alguns costumam dizer. Pelo contrário, estão criando “problemas” ainda mais resistentes, exigindo herbicidas e agrotóxicos mais fortes.

Adivinha onde todos aqueles produtos químicos, altamente tóxicos, vão parar? Exatamente, no alimento do prato das pessoas.

Então, por qual motivo algumas pessoas querem tanto nos persuadir que os transgênicos são inofensivos, dão menos pragas e tem produção mais abundante? É simples, as sementes OGM são patenteadas e propriedade de apenas alguns grupos empresariais (Monsanto, Syngenta, Dupont, Basf, Bayer, Dow…), então os agricultores tem que pagar para usá-las, não podendo aproveitar sementes da safra obtida, tendo que comprar novas das companhias fornecedoras.

No Brasil, essas transnacionais compraram praticamente todas as pequenas e médias empresas de sementes, além de dominarem a cadeia agroalimentar desde a produção de sementes, agroquímicos e agrotóxicos até a parte de logística, transporte e exportação. Os agricultores hoje no Brasil estão submetidos aos interesses dessas transnacionais. Isso é um problema grave para um país que quer ter soberania alimentar e condições melhores de produção para garantir alimentos de qualidade à população“, declara Darci Frigo, advogado da organização socioambientalista Terra de Direitos.

Como consequência desta cadeia de produção, estamos perdendo biodiversidade e diversidade alimentar das sementes orgânicas e crioulas, o advogado ainda afirma: “Essas empresas vêm homogeneizando a dieta com poucos produtos. Basicamente, aqueles produtos que interessam a elas do ponto de vista da aplicação de determinados agrotóxicos ou outros insumos, com a chamada venda casada“.[6]

Perante todos esses fatos, fica complicado refutar a ideia professada por Vandana Shiva, segundo ela, estão pretendendo estabelecer uma espécie de ditadura alimentar, onde poucas empresas controlam o fornecimento alimentício global e não há plantadores independentes.

Colheita em La Crau com Montmajour ao fundo, Vicent Van Gogh

Outro ponto que fica claro no decorrer do documentário citado, é que as produtoras de transgênicos são muito boas de discurso, contudo são péssimas de diálogo. O discurso é um monólogo, onde um fala e outro apenas escuta. Já o diálogo, muitas vezes presume perguntas, questionamentos de outra parte. Durante todo o filme, o documentarista não consegue estabelecer contato com as empresas. Será que essas transnacionais não se sentem seguras, para responder alguns questionamentos naturais e básicos, sobre a mercadoria por elas produzida e vendida? É de se estranhar…

E porque a câmara dos deputados aprovou Projeto de Lei 4148/08, com 320 votos a 135? Oras, nossos parlamentares, como muitos outros do mundo afora, recebem recursos destas empresas, principalmente no período de campanha eleitoral. Com uma supressão do selo de transgênica é mais complicado separar o “joio do trigo”, tal qual fez o homem da metáfora.

Além disso tudo, a decisão é uma afronta ao artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que versa sobre os nossos direitos básicos:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

Para nossa felicidade, o Senado Federal abriu uma pesquisa de opinião sobre o assunto, nós temos que votar “contra” e impedir a retirada. Vote acessando o seguinte link: Opine sobre Projetos – Projeto de Lei da Câmara (PLC 34/2015)

E o que nós podemos fazer em termos mais práticos? O primeiro passo é procurar, na medida nosso possível, substituir os produtos OGM por produtos mais naturais, valorizando o pequeno produtor que ainda se esforça para semear sementes crioulas.

A única maneira de reverter essa situação é cada pessoa fazer seu papel de recuperar a liberdade e a democracia do alimento. O que nós comemos decide quem somos, se nosso cérebro está funcionando corretamente, ou nosso metabolismo está saudável ou, se por conta de micronutrientes, estamos nos tornando obesos. Isso afeta todo mundo: os mais pobres porque lhes foi negado o direito à comida; mas até os que podem comer porque não estão comendo comida. Chamo isso de anticomida, porque a comida deveria nos nutrir. A comida mortal que as corporações estão trazendo para nós destrói a capacidade da comida de nos nutrir e no lugar disso está nos causando doenças.

Cada um de nós deve se tornar um forte ativista da liberdade da comida e das sementes no nosso dia a dia. O que significa que temos que apoiar mais os fazendeiros e a agroecologia. Devemos ser comprometidos com a alimentação saudável.“[7]

A sociedade urbana tem um importante lugar nesse apoio a agricultura orgânica, veja a fala de Vandana: “Comprando, alimentos dos pequenos produtores, ajudariam não apenas o agricultor familiar, mas também ajudariam a Terra e seus próprios corpos.

selo de produto organicoPor fim, o fortalecimento do selo Produto Orgânico Brasil, regulado pela Lei dos Orgânicos (Lei 10831/03), também pode somar, facilitando a identificação daquilo que é livre de organismos geneticamente modificados.

Não será tão fácil, porém é possível, vamos observar os rótulos, pesquisar e nos informar a respeito do que consumimos.

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[1] Cientista da UEM: “Transgênicos Geram Alergias, Esterilidade, Alteração na Formação de Orgãos e Cânceres
[2] Half of All Children Will Be Autistic by 2025, Warns Senior Research Scientist at MIT
[3] Inimiga nº1 dos transgênicos, física indiana denuncia ditadura da indústria alimentícia
[4] Família norte-americana produz 3 toneladas de alimentos orgânicos no próprio quintal
[5] Organic farms win at potato pest control
[6] Grupo de seis empresas controla mercado global de transgênicos
[7] Vandana Shiva.

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