Riscos psicossociais não têm crachá: como ambientes negligentes afetam a saúde de todos – por Luanna Cunha

Luanna Cunha é Psicóloga Clínica e Organizacional - Foto: Divulgação

Não importa o cargo, a função ou o tempo de casa. Quando falamos de riscos psicossociais, estamos falando de algo que atravessa todos os níveis da organização — e que muitas vezes é ignorado em nome da produtividade ou da cultura do “aqui sempre foi assim”.


O que pouca gente sabe (ou prefere não ver) é que ambientes negligentes em relação à saúde mental são, na prática, espaços adoecedores. E mesmo quem aparenta estar “dando conta de tudo”, pode estar à beira do colapso emocional.

A ilusão do ambiente neutro

Os ambientes de trabalho não são neutros. Eles moldam comportamentos, reforçam (ou desconstroem) crenças, e influenciam diretamente no bem-estar dos colaboradores. Quando esses ambientes não promovem segurança psicológica, escuta ativa ou clareza nas relações, os riscos psicossociais se instalam — muitas vezes de forma silenciosa.

Entre os principais riscos estão:

Exigência excessiva de produtividade
Falta de reconhecimento e valorização
Ambiguidade de papéis
Assédio moral ou institucional
Isolamento social
Falta de apoio das lideranças

A NR-01 e o reconhecimento oficial

A atualização da Norma Regulamentadora nº 01 (NR-01) reforça que os riscos psicossociais devem ser identificados, avaliados e gerenciados, assim como os riscos físicos, químicos e ergonômicos. Ou seja, não é mais aceitável tratá-los como “questão subjetiva”.

A ausência de ações concretas para lidar com esses riscos pode resultar não apenas em adoecimento individual, mas também em perdas significativas para a organização: aumento do absenteísmo, rotatividade, baixa performance e processos trabalhistas.

Efeitos práticos: o que vejo na clínica e nas empresas

Homens e mulheres chegam aos atendimentos trazendo sintomas como:

Insônia crônica
Sensação de inutilidade
Medo constante de errar
Irritabilidade ou apatia
Sensação de esgotamento antes mesmo de começar o dia

Muitas mulheres relatam, ainda, a dificuldade de serem ouvidas ou levadas a sério quando expressam cansaço emocional — sendo taxadas de “sensíveis demais”, “estressadas” ou “descompensadas”.

Essa naturalização do sofrimento é um dos fatores que mais perpetuam a negligência institucional.

Quem paga a conta?

Não são apenas os profissionais da base que sofrem. Lideranças também adoecem — especialmente quando carregam, sozinhas, a responsabilidade de resultados sem o suporte adequado. A diferença é que, em muitos casos, gestores sentem-se impedidos de demonstrar vulnerabilidade por medo de perder autoridade.

Esse ciclo vicioso precisa ser quebrado. E o caminho começa por reconhecer que ninguém está imune aos impactos de um ambiente emocionalmente tóxico.

O que é um ambiente emocionalmente saudável?

Segundo a psicologia organizacional, ambientes que favorecem a saúde mental apresentam:

Clareza de papéis e objetivos
Comunicação não violenta
Lideranças acessíveis e emocionalmente disponíveis
Valorização do trabalho e reconhecimento
Espaços para escuta, feedback e crescimento emocional

Empresas que investem nesses aspectos colhem equipes mais engajadas, criativas e produtivas — com menor índice de adoecimento e maior retenção de talentos.

Reflexão final:

O risco psicossocial não aparece no crachá nem no contrato de trabalho, mas deixa marcas profundas no corpo, na mente e na autoestima. Você está em um ambiente que cuida da sua saúde ou apenas exige sua entrega?

Luanna Cunha é Psicóloga Clínica e Organizacional

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