Greve na Argentina paralisa país e expõe divisões políticas e sociais 

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Manifestantes fizeram barricadas nos principais acessos da capital argentina

Reuters

A greve geral que paralisou a Argentina na última quinta-feira (10) foi comemorada pelo seu principal líder Hugo Moyano, dirigente da CGT (Central Geral dos Trabalhadores) que ressaltou o grande número de participantes. 

—Em todo o país tem sido um dia[ontem] importante. Isso mostra que quando lançamos a convocação acreditamos que estávamos representando hoje ficou claro o desencanto que há nas pessoas.

O líder da CGT afirmou que em alguns setores a greve contou com adesão de até 98% dos trabalhadores. Para ele, a paralisação foi “importantíssima” para chamar atenção da presidente Cristina Kirchner e seus aliados.

— Peço ao governo que preste atenção no que expressou o povo. 

A greve nacional foi convocada  por sindicatos opositores ao governo de Cristina Kirchner em meio a um coquetel de tensões econômicas, disputas políticas e crescente clima de conflito social. 

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A paralisação tinha como principais reivindicações melhorias salariais acima de 40% e um aumento do teto salarial isento do pagamento do imposto que pesa sobre os trabalhadores que ganham mais de 15 mil pesos mensais (cerca de R$ 3.700).

Os sindicatos exigem ao governo que não tente impor amortecedores máximos para as altas salariais nas negociações paritárias, que estão em pleno desenvolvimento.

Em voz baixa, o Executivo pretende que as altas não excedam 20% para pôr panos frios em uma das variáveis fundamentais da economia, os salários, que incidem nos custos de produção e, por ali, na inflação, que, segundo consultoras privadas, cresce a um ritmo anualizado de 35%, carcomendo o bolso dos trabalhadores.

“Esta greve geral acontece quando, pela primeira vez em mais de uma década do kirchnerismo no governo, o poder aquisitivo do salário começou a cair e quando as aposentadorias perdem frente à inflação, também pela primeira vez desde 2009”, comentou o analista Rosendo Fraga.

Fator Hugo Moyano

Para o governo, a greve, em plena negociação salarial, tem motivações políticas, já que é liderada pelo poderoso titular do grêmio dos caminhoneiros, Hugo Moyano, um dos principais líderes opositores ao governo, do qual antes era um de seus principais aliados.

De fato, Moyano rompeu definitivamente com o governo em 2012, quando organizou uma bem-sucedida greve contra Cristina graças à paralisação total do transporte.

Segundo Fraga, a greve se realiza em um contexto de força do sistema político-institucional argentino, apesar da derrota eleitoral do governo nas legislativas de outubro do ano passado e da queda nas pesquisas da aprovação de Cristina, que não consegue controlar a insegurança, uma das principais preocupações sociais na Argentina.

A onda de crimes de conflito nas ruas se tornou tema de discussão política entre os candidatos à Casa Rosada nas presidenciais de 2015 e Moyano, ao convocar esta greve, incluiu esta problemática entre as exigências ao assegurar que a insegurança é “insustentável e insuportável”.

O caldo da segurança pública vem entornando na Argentina, com delitos cada vez mais violentos, o crescimento do narcotráfico e virulentas expressões de anomia como a suscitada no final do ano passado, quando, no meio da greve policial mais extensa do país, ocorreu uma onda de saques na qual morreram 11 pessoas.

O tema não saiu da agenda pública. À discussão política pela iminente reforma do Código Penal, que poderia implicar em menores penas para delitos graves, se soma agora o fenômeno dos linchamentos de supostos delinquentes que seus autores justificam por uma suposta falta de ação da polícia e da Justiça.

Atento à conjuntura, o governador da província de Buenos Aires, Daniel Scioli, que deve concorrer nas próximas presidenciais, declarou “estado emergência por insegurança” em seu distrito.

Scioli, um governista de relação ambivalente com a Casa Rosada, acaba assim referendando quem desponta como um dos principais candidatos opositores à presidência, Sergio Massa, ex-chefe de gabinete de Cristina e que colocou a segurança como um de seus eixos de campanha.

A este coquetel que rodeia a greve se somam as mobilizações e cortes de ruas e estradas convocadas por organizações de esquerda, o que acrescenta mais lenha à fogueira do descontentamento social.

Segundo dados da empresa de consultoria Diagnóstico Político, o nível de conflito social medido em cortes de vias públicas alcançou um recorde desde 2010, com 658 piquetes no total, 48% a mais que há um ano.

O fenômeno, segundo explicou o analista Patrício Giusto, “teve um esperável aumento devido aos conflitos salariais com grêmios estatais e privados na maioria das províncias, além de protestos de organizações sociais e moradores, com a insegurança como principal motivo de reivindicação”.

“O cenário da alta de conflito é uma conjuntura com alta inflação, queda da atividade econômica, aumento da insegurança, assim como também da violência na via pública”, sintetizou o analista. 

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