Imprensa pode ser responsabilizada por fala de entrevistado, decide STF

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O plenário do STF fixou uma tese hoje que estabelece critérios que permitem responsabilizar veículos de imprensa por declarações de entrevistados que imputam falsamente crimes a terceiros.


O que o Supremo decidiu

A punição, segundo o tribunal, se dará somente em casos de “indícios concretos de falsidade” da imputação ou se o veículo deixou de observar o “dever de cuidado” na verificação dos fatos e na divulgação de tais indícios.

A tese foi fixada a partir de um processo envolvendo o Diário de Pernambuco, em 1995, e servirá de parâmetro para casos semelhantes. Trata-se do julgamento de um pedido de indenização do ex-deputado Ricardo Zarattini Filho, que já morreu, contra o jornal por uma entrevista publicada em 1995.

Nove ministros mantiveram a condenação do jornal em agosto passado, mas a Corte não chegou a formar uma tese. Houve divergências entre os magistrados.

Hoje, o ministro Alexandre de Moraes sugeriu uma proposta que foi acatada pelos demais integrantes da Corte. Ele foi um dos votos pela condenação do jornal.

A proposta afirma que a proteção à liberdade de imprensa veda a censura prévia, mas permite a responsabilidade posterior dos veículos de imprensa por “informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas” que sejam publicadas. Tais conteúdos podem ser removidos — este trecho foi sugerido pelo ministro Cristiano Zanin e aprovado pelos demais ministros.

A empresa poderá ser responsabilizada somente em dois cenários no caso do veículo que publicar uma declaração de entrevistado que imputa falsamente a prática de crime por terceiro:

  1. Se “houver indícios concretos de falsidade da imputação” na época da publicação;
  2. Se o veículo “deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.

Entenda o caso

Em 1995, o Diário de Pernambuco divulgou entrevista com o delegado Wandenkolk Wanderley, também já morto, que acusou Ricardo Zarattini Filho de participar do atentado a bomba no Aeroporto dos Guararapes, em Recife, em 1966, durante a ditadura militar.

A defesa de Zarattini Filho afirmou que a acusação não era verdadeira e cobrou indenização do veículo. O pedido foi julgado procedente pelo STJ, e subiu ao Supremo por um recurso do Diário de Pernambuco.

‘Atenção redobrada’, diz Fenaj

“A tese traz um grau de responsabilização minimamente condizente com as nossas preocupações de resguardo da liberdade de imprensa e de expressão”, disse a presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), Samira de Castro.

Samira, porém, afirma que veículos precisarão ter uma “atenção redobrada” durante entrevistas ao vivo – em que é mais difícil fazer uma checagem das declarações do entrevistado. “Mas acho que o caminho fica aberto, uma composição que não traga tantos prejuízos para a atividade jornalística”, disse.

Esse dever de cuidado que o ministro [Moraes] cita na tese é na verdade o fato de você ouvir o outro lado, dar espaço para o contraditório na medida em que o seu entrevistado impute o que posteriormente for chamado de falso crime, calúnia, injúria e difamação Samira de Castro, presidente da Fenaj

Ontem (28), nota conjunta de sete entidades ligadas ao jornalismo, como a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e o Instituto Vladimir Herzog, demonstrou preocupação com o tema.

No texto, as associações afirmam que as entrevistas são um “elemento fundamental para o exercício jornalístico” e que casos históricos, como as declarações de Pedro Collor ou Roberto Jefferson, no Mensalão, tiveram impactos no rumo do país.

Leia a íntegra da tese aprovada pelo STF

1. A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.

2. Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.

Fonte: Uol

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