Manés, cagões, maricas, ridículos e vagabundos – por Carlos Santiago

Carlos Santiago é Sociólogo, Analista Político e Advogado

Como é possível entender um país de regime democrático no qual os seus governantes chamam os seus governados de vagabundos, de maricas, de manés, de ridículos e de cagões?


Nas ditaduras, pequenos grupos tomam conta do poder estatal com todos os instrumentos de força, de propaganda e de poder econômico para perseguir opositores e reprimir qualquer contestação popular. Os governantes não são obrigados a prestar contas dos seus atos ao povo e nem chamam a população para decidir os rumos do país. Houve, inclusive, no Brasil, um ditador que preferia o cheiro de cavalo ao do povo.

Nos regimes democráticos, os governantes expressam o perfil cultural da maioria de uma coletividade, assim como as decisões eleitorais do povo refletem a qualidade política de seus governantes. Logo, os rumos de um país são determinados por decisões dos governantes e dos governados. O respeito aos cidadãos e às leis são elementos imperais da democracia.

Porém, no Brasil, mesmo no regime democrático, o cidadão e a cidadã, ainda, são tratados com ralés ou párias, empecilhos ou imprestáveis. No período em que governava o país, o presidente Fernando Henrique Cardoso, inconformado com as críticas direcionadas à proposta de Reforma da Previdência do seu governo, chegou a dizer que os contrários à proposta, eram vagabundos.

O ministro do Supremo Tribunal Federal – STF, Luís Roberto Barroso, classificou de mané um eleitor que contestava o resultado da eleição para presidente da República. O Brasileiro até usou de provocação contra o ministro, mas atitude do ministro deixou o pensamento da elite brasileira.

Recentemente, o ex-presidente Jair Bolsonaro, ainda no exercício do poder, inconformado com a pressão pública para agir contra a pandemia da COVID-19, falou que o Brasil tem que deixar de “ser um país de maricas” e enfrentar a pandemia de “peito aberto”.

E, em uma reunião ministerial, ele não se intimidou em expressar que a sua eleição para a presidência em 2018 foi uma cagada, “uma cagada positiva”. A mídia noticiou, também, que o general Braga Neto denominou um outro general de “cagão”, pois o general Freire Gomes não teria aderido ao plano de poder do grupo presidencial da época.

Em 28 de agosto de 2023, quando questionado pela opinião pública sobre o valor da propaganda do evento Sou Manaus Passo a Passo 2023, da Prefeitura de Manaus, nas telas da Times Square, em Nova York, o prefeito da capital do Amazonas chegou a dizer “como os ridículos acabam se sobressaindo” diante da “criatividade”

Pois bem. Não é novidade que o Brasil é um país muito desigual, violento, patriarcal e elitista. É só olharmos a forma como a maioria dos políticos e governantes trata o povo; é só olharmos os números de milhões de pessoas vivendo na extrema pobreza; os índices de vítimas de mortes violentas; a quantidade de mulheres mortas por feminicídio e o uso do Estado por elites políticas para privilegiar interesses financeiros; familiares e até estamentos que controlam parte dos recursos e cargos públicos há séculos.

E, enquanto o brasileiro e a brasileira não se veem como cidadãos e cidadãs, elegendo governantes com qualidade que respeitem o povo e sem elitismo, o eleitorado continuará votando em governantes que olham o povo e a opinião pública como um monte de manés, de vagabundos, de cagões, de ridículos e de maricas.

Carlos Santiago é sociólogo, advogado e pós-graduado em Ciência Política

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