
A Rússia tem utilizado redes sociais, incluindo o TikTok, para recrutar estrangeiros que acabam enviados à linha de frente na guerra contra a Ucrânia. É o que revelam relatos de dois cidadãos chineses capturados por forças ucranianas em Donetsk. Wang Guangjun e Zhang Renbo alegam que foram atraídos por vídeos publicados na plataforma e acabaram lutando em brigadas do Exército russo.
Em paralelo, as autoridades ucranianas afirmam ter identificado mais de 160 cidadãos chineses integrando as forças russas. A informação foi divulgada em abril, quando os dois prisioneiros concederam entrevista coletiva em Kiev. Os chineses capturados disseram terem sido convencidos a se alistarem após assistirem a vídeos de recrutamento no TikTok, descritos por eles como “bem produzidos” e com “apelo visual”. Segundo Guangjun, as gravações ofereciam a oportunidade de lutar pela Rússia como algo acessível e promissor.
Guangjun relatou que entrou em contato com um recrutador logo após assistir a um dos vídeos. Ele afirmou que, na China, o serviço militar é associado a prestígio, o que teria influenciado a decisão. A viagem e as despesas foram cobertas por intermediários, que não disseram sua nacionalidade aos recrutas. Após passarem por Moscou, os dois seguiram para Rostov-on-Don, onde receberam treinamento básico antes de serem deslocados para Donetsk, região de maior conflito entre Rússia e Ucrânia.
Renbo afirmou ter recebido um cartão bancário com 200 mil rublos (cerca de R$ 14 mil, em valores atuais), mas não conseguiu utilizá-lo. O valor seria destinado a despesas básicas, mas, segundo ele, o cartão foi confiscado por soldados russos com a justificativa de que o valor seria usado para cobrir gastos com combustível.
Os dois chineses disseram ter sido mantidos separados de outras tropas e descreveram uma rotina marcada por isolamento e informações imprecisas. Em sua unidade, Guangjun contou que havia apenas dois soldados chineses entre dez combatentes. Ambos negam ter sido instruídos a cometer suicídio em caso de captura, como teria ocorrido com soldados norte-coreanos. Ainda assim, afirmam que foram alertados de que poderiam morrer se feitos prisioneiros pelo Exército ucraniano.
Segundo o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, o governo chinês tem conhecimento da existência desses vídeos de recrutamento. Em declaração à imprensa, ele afirmou que o mais preocupante não são os alistamentos abertos, mas os esforços ocultos para atrair cidadãos estrangeiros para o Exército russo.
Guangjun e Renbo foram capturados em 8 de abril por forças ucranianas. Ambos relatam ter enfrentado bombardeios e drones durante os combates. Renbo foi capturado após caminhar 2,5 quilômetros até uma vila destruída, enquanto Guangjun foi guiado por um drone até uma posição ucraniana, onde recebeu comida e assistência médica.
Para o Serviço de Segurança da Ucrânia, a captura dos dois chineses expôs o uso das redes sociais como ferramenta de recrutamento militar por parte da Rússia e colocou a China em uma posição diplomática delicada. Até o fim de abril, o governo chinês não havia se pronunciado sobre o caso. Pequim já havia orientado seus cidadãos a evitarem áreas de conflito e alertado que lutar em exércitos estrangeiros constitui crime, segundo a legislação chinesa.
Os prisioneiros afirmam não ter ligação com o governo chinês e não possuíam experiência militar prévia. Ambos expressaram desejo de retornar à China, mas seguem sob custódia e ainda não foram contatados por organizações internacionais. Na coletiva, os prisioneiros alertaram outros cidadãos chineses a não se “deixarem enganar por promessas de dinheiro fácil e prestígio”.
Fonte: R7