No Brasil, tanto as Forças Armadas quanto as forças de segurança pública, como a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF), se orgulham de serem organizações estruturadas com base em hierarquia e disciplina, e se definem como um organismo coeso, onde todos trabalham juntos em prol de objetivos comuns.
Entretanto, ao analisar as remunerações dentro dessas instituições, fica evidente que, enquanto algumas, como a Polícia Rodoviária Federal, possuem um plano de carreira com diferenças salariais proporcionais entre os diversos níveis, a situação é bem diferente nas instituições militares federais, como o Exército, Marinha e Força Aérea. Nessas Forças, conforme pode-se ver em gráficos e comparações apresentadas abaixo, há um verdadeiro abismo entre os salários da base e os da cúpula. Enquanto os oficiais generais integram a elite nacional, pertencendo ao grupo dos 1% mais ricos do país — aqueles que recebem mais de 30 mil reais mensais —, os soldados e cabos estão muito mais próximos da realidade dos brasileiros de renda mais baixa, com salários que se aproximam do mínimo.
Essa discrepâncias geram preocupações e discussões sobre o impacto dessas diferenças no moral e na motivação dos militares que ocupam as posições mais baixas, que reclamam ainda de outras situações apontadas por profissionais do direito, como escalas de serviço apertadas e falta de assistência adequada no caso de acidentes de trabalho ocorridos no quartel.
Para comparação, segundo os últimos acordos sobre reposição salarial, o maior salário dentro da Polícia Rodoviária Federal será de R$ 23 mil em 2026, enquanto o salário de entrada estará na faixa de R$ 12,2 mil.
A discrepância salarial nas Forças Armadas: diferença abissal entre base x cúpula
Um soldado recém ingresso nas Forças Armadas Brasileiras, por exemplo, recebe atualmente um salário em torno de R$ 1,3 mil, enquanto um oficial general no topo da carreira, como o general de Exército Richard Fernandez Nunes, tem uma remuneração que pode chegar a R$ 36 mil, o que equivale a aproximadamente 27 vezes o salário do soldado.
Grande parte dos oficiais generais recebe ainda subsídios por conta de cargos ocupados. O General Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, por exemplo, além do salário de 38 mil reais, recebe ainda um adicional de 18 mil reais do Ministério da Defesa, o que eleva o salário para mais de 55 mil reais, recebendo assim o equivalente ao que recebem, juntos, 42 soldados do Exército. Durante o último governo as vantagens dos generais, almirantes e brigadeiros foram potencializadas mais ainda quando o Ministério da Economia concedeu uma autorização para que os oficiais generais extrapolassem o teto constitucional, com isso eles passaram a ter o direito de acumular salários que elevam seus ganhos até para mais do que recebem os ministros do Supremo Tribunal Federal.
Essa diferença gigantesca entre o menor e o maior salário dentro da hierarquia militar é curiosa, notável e levanta preocupações sobre a capacidade das Forças Armadas de reter e motivar sua base. Imagens que circularam recentemente no Rio de Janeiro, republicadas pelo canal no Instagram Militar Audaz, mostram uma fila de militares da Marinha do Brasil se apresentando para a realização de testes ligados ao concurso para ingresso na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro.
Mesmo em relação a um aspirante, primeiro degrau na carreira dos oficiais, o salário atual de um general de Exército soa como desproporcional diante do que ocorre em outras instituições. Enquanto um aspirante recebe 9 mil reais brutos, um general de Exército recebe em torno de 36 mil reais, o que equivale a 4 vezes mais.
Artigo publicado pela Revista Sociedade Militar no primeiro semestre de 2024 já mostrava um grande número de oficiais que pediam desligamento do Exército Brasileiro e um dos motivos principais apontados pelos oficiais ouvidos pela revista foi a baixa remuneração.
Segundo apurado, no Exército dos Estados Unidos, instituição vista como paradigma pelos oficiais generais brasileiros, o salário de um soldado recém ingresso é de cerca de 2 mil dólares mensais, enquanto um oficial general no último posto, com mais de 40 anos de serviço, recebe cerca de 18 mil dólares mensais. No “Army”, portanto, o militar no último posto recebe somente 9 vezes mais do que o soldado que acabou de ingressar.
A situação se agrava ainda mais diante das acusações recentes de sargentos e cabos das Forças Armadas chocados com a atuação da cúpula militar que nos últimos anos teria buscado benefícios não para a categoria como um todo, mas apenas para a cúpula da tropa. Nos últimos anos, apontam subtenentes e sargentos, os generais utilizaram seu status para aumentar os próprios salários de forma disfarçada, além da medida mencionada acima, que os livrou das limitações do teto constitucional, apresentaram projeto de lei elevando percentuais sobre cursos realizados, deixando parte da base militar sem qualquer reajuste nos últimos anos.
Veículos de imprensa – com base na legislação aprovada para o orçamento do próximo ano – anunciaram um reajuste salarial para os militares a partir de 2025, que seria pago em duas parcelas de 4.5%, mas o governo federal ainda não confirmou esse percentual.
Uma apuração realizada em canais de comunicação exclusivos de militares, como grupos restritos de WhatsApp, sugerem que há insatisfação da tropa, as reclamações vem principalmente daqueles que estão na reserva remunerada e que por lei tem garantido o direito de opinar sobre política e outros assuntos de caráter ostensivo. Para estes, se considerarmos que as Forças Armadas são, em tese, uma instituição baseada na igualdade de princípios, onde todos os membros devem compartilhar o mesmo senso de dever e compromisso, resguardando informações privilegiadas e vitais para a defesa nacional e dependendo uns dos outros para permanecerem vivos em um campo de batalha, as diferenças salariais atualmente tão acentuadas sugerem um distanciamento problemático entre os oficiais de alta patente e os militares que, de fato, estão na linha de frente do combate, que acabam se sentindo discriminados e desassistidos pelas cúpulas das instituições armadas.
Fonte: Sociedade Militar