Desde a prisão de Sara Winter, Bolsonaro é um fracassado – por Moisés Mendes

(Foto: Ueslei Marcelino/Reuters)

“Sem o blefe do golpe, sobrou para Bolsonaro o papel de genocida enredado no próprio roteiro. Bolsonaro é um fracassado como golpista”, escreve o jornalista Moisés Mendes, do Jornalistas pela Democracia.


Bolsonaro parecia seguir um roteiro com algum método, mesmo que caótico, até a prisão de Sara Winter, no dia 15 de junho. São sete meses sem Sara Winter.

Prenderam a moça, e Bolsonaro perdeu o controle de uma situação que parecia conduzir para um golpe. O blefe do golpe esvaiu-se com a prisão de Sara.

A partir do fim da líder dos 300 do Brasil, Bolsonaro passou a ser isso daí, tão disforme quanto um protozoário.

Fingiu que poderia fazer o personagem de um moderado, tentou enredar Dias Toffoli em abraços, buscou o colo do centrão e chegou ao estágio atual. Parece ter o controle do genocídio da pandemia, mas é um sujeito perdido.

Enfrenta agora a ressaca do que tentou fazer durante todo o primeiro semestre, quando sugeriu que caminhava na direção do golpe.

Tinha jeito de trama para golpe, tinha cenários, fala, figuras golpistas, tinha generais, mas não havia como assegurar que aquilo poderia ser um golpe que o transformasse num ditador.

Bolsonaro não sabia direito o que seria o golpe, quem estaria ao seu lado e como poderia manter o golpe e a que custo. Mas blefava e ameaçava.

Era movido pela inércia do blefe. Mas talvez Bolsonaro quisesse mesmo viver do próprio blefe e acovardar o Supremo, quando percebeu que os filhos poderiam ser cercados.

Era preciso manter o Supremo acuado. Mas quem do seu entorno poderia desejar e sustentar o golpe? Os militares que o acompanharam nas mobilizações de Sara Winter e afrontaram o STF? Queriam o golpe ou só tentavam atemorizar o Supremo?

Sara Winter é a personagem mais idiota do blefe, mas cumpre tarefa relevante com a encenação. Não bastava ter um discurso de enfrentamento do STF. Era preciso ter um teatro.

Por isso Bolsonaro contava com Sara. Não existia nem o jipe com o cabo e o soldado. De concreto, não existia nada da fantasia do golpe.

Mas Bolsonaro seguia em frente ao aparecer todos os domingos diante do Planalto, às vezes apontando para o STF, porque havia o teatro de Sara Winter. Ali ele se consagrava como ameaçador. A representação dramática do golpe era uma chinelagem, mas bastava para o alarido.

O programa de domingo de Bolsonaro consistia em aparecer para acenar para seus seguidores, nem todos ligados a Sara Winter, mas mobilizados pelo vigor cívico do grupelho da fascista.

E aí acontece então uma sequência devastadora de fatos. Celso de Mello e Augusto Heleno ensaiaram o duelo, no final de maio, e no dia 27 Luiz Fux leu um discurso escrito a quatro mãos com Dias Toffoli.

Pediu respeito às instituições, defendeu Celso de Mello e disse que o Supremo estava a postos como guardião dos valores republicanos.

Foi numa quarta-feira. No domingo, dia 24, Bolsonaro havia sobrevoado a manifestação pró-golpe, a bordo de um helicóptero do Exército. Sara Winter acenava do chão.

No dia 28, Bolsonaro respondeu ao discurso de Luiz Fux e Dias Toffoli e gritou: “Acabou, porra! Acabou!”.

O que passa a prevalecer, aparentemente, é a ameaça de Bolsonaro aos ministros do STF. Mas no dia 15 de junho Sara Winter é presa por determinação do ministro Alexandre de Moraes. No dia 18, prendem Fabrício Queiroz.

A prisão de Queiroz desestabiliza Bolsonaro emocionalmente, porque a partir dali tudo pode acontecer. Mas é a prisão de Sara Winter que o desorienta politicamente.

O blefe fica sem a encenação, até porque a prisão assusta todos os pregadores públicos do golpe, mesmo os que não tinham relação alguma com Sara.

Sara Winter não é nada, mas é quem anima a torcida, e sua prisão marca o fim do teatro. Sem artistas, com a surpreendente imposição do Supremo, não havia como manter a gritaria do ‘acabou, porra’.

Desde então, com Sara largada na sarjeta da prisão domiciliar, Bolsonaro não é apenas um ex-candidato a aprendiz de tirano. É o medíocre incapaz de ser aspirante a ditador.

O blefe do golpe era um fim em si mesmo. Bolsonaro vivia do blefe, e agora não sabe do que pode viver.

A pandemia e suas controvérsias com as vacinas, as seringas e os balões de oxigênio de Manaus não são a sua garantia de sobrevivência.

Sem o blefe do golpe, sobrou para Bolsonaro o papel de genocida enredado no próprio roteiro. Bolsonaro é um fracassado como golpista. Ele é isso daí. Amanhã, talvez não seja nem isso daí

Moisés Mendes – é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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